O mercado imobiliário em Paraisópolis

Agência Mural

Por Vagner de Alencar 

O preço de uma casa na rua é muito mais alto que de uma construída na viela. Se tiver escritura – uma raridade – passa a valer ouro, o que faz o valor inclinar significativamente. Imóvel de dois cômodos e um banheiro encravado dentro de um beco pode custar ao comprador, no mínimo, R$ 20 mil. Na rua, uma casa com o mesmo tamanho, chega a R$ 120 mil.

Essa é, hoje, a realidade de Paraisópolis, segunda maior favela de São Paulo, com status de uma valorização imobiliária tão alta quanto os ‘puxadinhos’ erguidos quase que diariamente entre seus cerca de 100 mil habitantes.

Há 17 anos, quando pisei em Paraisópolis pela primeira vez, fui morar em uma casa de quatro paredes de compensado (chapa feita com lâminas finas de madeira), que custou aos meus pais o preço que atualmente não se paga quatro meses do aluguel mais barato.

Paraisópolis se transformou, isso é inegável. Grande parte dos moradores tinha vergonha de dizer onde morava. “No Morumbi”, sempre era a resposta daqueles que tinham receio em dizer o endereço verdadeiro.

Grandes condomínios do Morumbi dividem o cenário com casas de Paraisópolis

Paraisópolis está encravada no coração do Morumbi – e talvez esteja aí o fato do imóvel na favela custar o preço de apartamento em ‘bairro’ que não é da periferia.

A favela está numa área nobre, a um quilômetro do estádio do Morumbi, dos hospitais Albert Einstein e São Luis, do Palácio dos Bandeirantes, de shoppings como Morumbi e Jardim Sul, de escolas renomadas como Colégio Franciscano Pio XII, Porto Seguro e Santo Américo.

Sim, a quinta favela mais populosa do Brasil está num cenário imobiliário considerado ‘perfeito’.

Reflexo de um programa de urbanização, Paraisópolis ganhou investimentos públicos, que, sem dúvida, melhoraram a qualidade de moradia, fazendo com que os moradores inflacionassem o valor de suas propriedades.

Do lado esquerda, apartamentos do programa Minha Casa, Minha Vida; à direita, prédios luxuosos do Morumbi

Cresceu também o número de estabelecimentos comerciais. Há petshops, casa lotérica, agências de bancos; em média, dez salões de beleza por rua, além de restaurantes, casas de materiais de construção e até corretora de imóveis formal e informal.

Manoel Ramos, 46, o popular Manoel Raizeiro, é um desses corretores que atuam por meio do boca a boca. Há 12 anos trabalha também com o comércio de ervas numa lojinha. Faz questão de mencionar que ‘está em dia com seus impostos’. Nas duas vezes que conversamos, quando eu fazia uma matéria sobre suas habilidades com as ervas medicinais, o que mais me chamou a atenção, além da medicina popular, foi a intensa demanda por imóveis para compra e locação.

Em um desses encontros com Manoel, durante os sessenta minutos que conversávamos, ao menos meia dúzia de pessoas passaram pelo estabelecimento, especialmente à procura de casas para alugar.

O ‘corretor’, para enfatizar a demanda, me mostrou um documento – uma folha de sulfite digitalizada com a negociação entre comprador e vendedor, formalizada somente pelas assinaturas de ambos. A incumbência de Manoel é digitalizar os documentos e intermediar os negócios.

Vista de uma laje na viela do Campo, em Paraisópolis

No ‘papel’ constava a venda de uma casa de quatro cômodos por R$ 45 mil. A transação havia sido uma excelente oportunidade ao novo proprietário do imóvel, que podia ser vendido por até 70 mil. Pela intermediação, o corretor garantiu a fatia de 1.500 reais, ou como costuma se referir, o seu “cafezinho”.

Se o comprador for montar um negócio na propriedade comprada, carecerá ainda desembolsar mais capital para demolir e reconstruir no local. O preço inflaciona porque o morador quer vender para empresários. Nessa lógica, comprar imóveis no centro de Paraisópolis está sendo praticamente impossível à maioria dos moradores. A região agora é alvo de empresas, que podem enfrentar os altos preços.

Há imóveis de 75 metros quadrados orçados em R$ 130 mil. Uma casa de 20 metros na rua da feira está à venda por 120 mil, ou seja, 6 mil reais o metro quadrado.

Com a valorização imobiliária em Paraisópolis, Edjalma Santos, 28, é uma entre as centenas de moradores que parecem seguir uma teoria comum: “Se eu pudesse, compraria outra casa para alugar. O aluguel só tem subido de preço. E, claro, é um excelente negócio para nós”, diz.

 

O site Folha SP Dados fez uma radiografia com diversos indicadores de Paraisópolis. Confira clicando aqui.

 

Vagner de Alencar, 25, é correspondente de Paraisópolis.

@vagneralencar

vagnerdealencar.mural@gmail.com

Comentários

  1. Muito interessante o texto.
    O que mais me preocupa é a maneira como as pessoas adquirem/comercializam suas casas nessas regiões… é comum vermos pessoas vendendo seus imóveis sem nenhuma documentação e muitas vezes a casa onde moram ficam em teremos da prefeitura.
    O boom imobiliário está atingindo todas as regiões da cidade, mas esclarecimento com relação a compra e venda dos mesmo não. =/

    PS: as fotos estão lindas!

  2. É bacana ver que cada periferia tem uma característica diferente pela sua localização, dá para ver as vantagens e desvantagens de estar perto de um bairro nobre.

  3. O contraste de preços em Paraisópolis realmente é impressionante, como pode uma casa ser vendida por 45 mil reais e outra por 120 mil reais apenas por uma estar numa viela e outra na rua? As duas tem a mesma distancia dos lugares burgueses do Morumbi.

  4. norte e nordeste invadindo S.P.Aí né arruma hospitais, creches,escolas, condução, emprego,para toda essa represa de população avulsa.Vamos estimular os nem nem,os rolezinhos e os bailes funk.he he he….

  5. A omissão das prefeituras da região metropolitana em relação às ocupações irregulares é criminosa. Rios, córregos e mananciais são poluídos com o despejo de esgoto sem tratamento, ligações clandestinas de água, luz e até TV a cabo comprometem a qualidade do serviço e o fornecimento para os usuários pagantes; além disso, a não inibição das ocupações é um convite para a migração e o crescimento desordenado das cidades, reduzindo as possibilidades de melhoria da qualidade de vida de toda a população.
    É preciso enfrentar o problema oferecendo condições dignas de moradia à população favelizada, estimulando-a a progredir integralmente e não a resignar-se com as condições de vida degradantes das favelas.

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