A voz das favelas na Rio+20
Por Tatiane Ribeiro, no Rio de Janeiro
O que os moradores da favela têm a dizer na Rio+20? Muito. Pelo menos para os participantes das atividades do CSP-Conlutas realizado ontem, dia 21/6, na Cúpula dos Povos, evento da sociedade civil em paralelo à Conferência de Desenvolvimento Sustetável da ONU.
Cinco rodas de conversa dentro da programação do evento debateram temas como: “Violação dos direitos humanos, sociais e ambientais nas favelas”, “Direito a Moradia X Grandes Obras”, “O Direito da Juventude nas Periferias e Favelas”, “A Contribuição do Saber Popular para a Transição de um Novo Modelo Sustentável” e “Mulheres: Trabalhadoras contra o Machismo e a Exploração”.
“Para debater novos caminhos para a economia é preciso dar voz aos problemas que o atual sistema causa. São milhares de trabalhadores que constroem a riqueza dos países e ficam sem direito de acesso às necessidades básicas”, afirma Jéssica Raul, 28, estudante e moradora do bairro de Acari, local com um dos menores IDH do Rio de Janeiro.
“Não aceitamos ser chamados de comunidade, porque nas favelas não há educação, saúde, saneamento básico. Nossos direitos são violados. É esse sistema que provoca e ao mesmo tempo promove essa situação”, diz Rumba Gabriel, 57, fundador do Movimento Popular de Favelas.
A violência policial também foi tema das discussões. “A pacificação é um tabu, não há discussão pública, o espaço é militarizado. O bandido foge e o pobre é obrigado a ficar”, questiona Jéssica.”Não é exterminando a população favelada que se acaba com o tráfico. Eles não sabem isso? Se eu que sou estudante, sei.”
“Na favela não tem plantações nem laboratórios, mas eles insistem em apontar as armas para os morados em vez de apontar para as fronteiras”, diz Gabriel.
Um dos pontos mais recorrentes nas discussões foi a falta de investimento em educação. “Não queremos compaixão. O governo quer dá escola, mas não se preocupa com que tipo de escola é essa onde as crianças vão estudar”, reflete Ciro Garcia, líder comunitário.
Darci Anacleta, 59, conselheira tutelar em Acari, afirma que o acesso à educação é muito restrito. “São poucas escolas, sem curso profissionalizante. Se o sistema não dá oportunidade para os jovens, outros darão”.
Também esteve presente Camila Lisboa, 27, professora estadual da rede pública de São Paulo, que debateu sobre o direito das mulheres. “Há ainda poucas casas de abrigo e delegacias especializadas”, finaliza a ativista ,que também expôs o trabalho de conscientização com as mulheres que viviam na favela Pinheirinhos.
Vanderlei da Cunha, 57, poeta e animador, mais conhecido como Deley de Acari, falou da questão cultural. “Quando a mídia dá alguma notícia sobre cultura nas favelas não informa, por exemplo, que há oito saraus que acontecem em bairros diferentes na cidade do Rio de Janeiro. Não divulga que há concertos, festivais de rock. Só destaca o funk sexista que fala de violência. Mas não é só isso que existe”.
“Não existe condição de defender questões sobre o meio ambiente se o que está em risco é a espécie humana”, finaliza Garcia.
Tatiane Ribeiro, 26, é correspondente da Bela Vista.
@TaTyaa
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Tati,
Parabéns pela abordagem. O seu texto foi muito bem construído e trouxe um aspecto novo para discussão que eu gostei muito: mais uma vez os moradores da periferia são estereotipados! O entrevistado Vanderlei da Cunha se saiu muito bem em destacar qual a visão da imprensa quando fala da favela, da periferia, retratando apenas o funk e a violência.