Ex-campeão promove aulas de boxe gratuitas embaixo de viaduto de Perus
“Vai, Perus!”, gritava eufórica a plateia enquanto Dionilson e Everaldo subiam pela primeira vez em um ringue de boxe. Mesmo debaixo de intensa chuva, famílias inteiras, idosos e até crianças prestigiaram as lutas do 11º evento de boxe do bairro de Perus, zona norte de São Paulo, realizado há duas semanas pela Escola de Boxe João Ferreira.
O evento foi totalmente gratuito e contou com a presença de lutadores profissionais, amadores e também de representantes da Confederação Brasileira de Boxe, o que permitiu o reconhecimento das lutas pela Confederação e pelo ranking britânico BOX REC.
O último e mais esperado duelo daquele dia valeu o Título Sulamericano de boxe. Com 21 vitórias na carreira, Edson Borges, 38, saiu campeão naquela tarde. O boxeador luta como profissional na categoria de super-médio-ligeiro, e sua história se assemelha com a de muitos outros que subiram no ringue naquele dia.
Ele trabalha como motoboy durante o dia e, à noite, treina de três a quatro horas. “Comecei aos 14 anos. Não tinha dinheiro nem pra pagar o ônibus para o treino, por isso corria 5 km do trabalho até o ginásio [Ginásio Municipal José Liberatti, em Osasco, na Grande SP]. É só a força de vontade mesmo que te faz continuar”, diz.
Assim como Edson Borges, Adilson Silva, 32, conhecido como Careca, também iniciou sua carreira na adolescência, em Francisco Morato (também na Grande SP), cidade que representou em jogos regionais e abertos durante seis anos, sem receber nenhum tipo de financiamento. Segundo Silva, a dificuldade de se conseguir patrocínio é que leva um lutador a buscar algumas alternativas de renda. “Trabalho como segurança, mas viver de boxe é um sonho. Eu ainda não encontrei a veia certa para estourar no boxe, mas nunca desisti”, conta.
A alternativa que Silva e outros atletas encontraram para continuar no esporte está em uma escola de boxe que fica embaixo do viaduto Ulisses Guimarães, em Perus. Mesmo em meio ao barulho dos carros, é lá que o ex-campeão e professor de boxe, João Ferreira, 56, oferece treinos gratuitos para pessoas de todas as idades. “Tem época que chega a ter quarenta alunos aqui. Mas, de quarenta pessoas que vêm, uns quatro levam adiante”.
Ferreira lutou boxe como profissional durante 22 anos, e, ao aposentar as luvas, resolveu passar adiante sua paixão pela modalidade. Iniciou o trabalho voluntário na Vila Nova Cachoeirinha (zona norte de SP) e, a partir de 2002, instalou a escola improvisada debaixo do viaduto de Perus. A iniciativa vem dando tão certo que, em outubro de 2012, um dos atletas da escola, Acácio João Ferreira, foi campeão mundial da categoria meio-médio na Argentina.
Rafael Ferreira, 18, era um desses garotos que não gostavam de ir para a aula de Educação Física por não se dar bem com o futebol. Mas, em 2008, enquanto passava debaixo do viaduto, descobriu a escola e, hoje, o boxe já se tornou uma paixão. Rafael relembra orgulhoso de sua vitória na Copa Brasil de Boxe de Cascavel (PR), mas não deixa de destacar as dificuldades que um atleta encontra para seguir carreira. “
No Brasil, só investem em futebol masculino. Aqui, é o João que cuida de tudo. Devia ser a Prefeitura”, diz. “Se cada comerciante de Perus colaborasse com dez reais por mês, nós faríamos grandes eventos de boxe”, complementa João Ferreira.
Hoje, a Escola João Ferreira está registrada como uma Organização Não Governamental (ONG), a Caminho com o Futuro, presidida por João Ferreira e administrada por Shirley Sukuky.
Serviço:
Escola de Boxe João Ferreira – Caminho com o Futuro
Treinos: segunda, quarta e sexta-feira, das 17h30 às 21h.
Site: http://caminhocomfuturo.50webs.com/
Contato: (11) 9 -7576-1178
Jéssica Moreira, 20, é correspondente de Perus.
@gegis00
jessicamoreira.mural@gmail.com