Moradora de Perus cria centro cultural dedicado à condição feminina

Agência Mural

“Foi preciso o meu filho nascer para eu renascer como mulher”. A fala, dita ao mesmo tempo em que preparava o almoço, é de Manoela Gonçalves, 30, que, assim como outras tantas mulheres da periferia de São Paulo, trabalha e ainda cria sozinha o filho Manolo, de quatro anos.

Estilista, em 2013 a moça decidiu deixar o emprego de assessora de imprensa para realizar um sonho antigo: criar um espaço cultural onde, além de trabalhar, pudesse acompanhar mais de perto a educação do filho. Foi assim que ela fincou os pés no bairro de Perus, zona norte de São Paulo. E botou as mãos na massa, literalmente, para reformar um antigo brechó e transformá-lo na Casa das Crioulas.

O espaço, destinado a diversas manifestações culturais e educativas, terá como foco a discussão acerca do papel feminino na sociedade, abrindo espaço a todas as mulheres de Perus para a troca de vivências e discussões sobre a mulher na periferia.  

Manoela Pontes arruma a Casa das Crioulas
Manoela Pontes arruma a Casa das Crioulas

 

“A vida da mãe solteira nunca é calma. Acorda cedo para ir trabalhar, volta correndo para buscar o filho na creche. Chega em casa, liga na novela, mas com a cabeça nas contas a pagar. Ou paga o aluguel da casa ou faz a festa de aniversário da criança. Ou o sapato pra ele ou o sapato pra mim’. Ela tem que levar a criança no médico, mas perde a data marcada. Quer passear, mas não tem com quem deixá-lo. E tudo isso vai gerando frustração”, aponta Manoela.

Ela idealizou a Casa das Crioulas após entrar em contato com as reivindicações feministas, ler sobre a situação de mulheres que chefiavam famílias em São Paulo e participar de grupos compostos por mães solteiras.

Iniciada em setembro, a reforma do espaço está sendo feita de forma colaborativa, envolvendo moradores da região, comerciantes e pessoas de outros locais.

A fachada já reformada, toda adornada com coloridos mosaicos, já gera a curiosidade de quem passa na rua. “Antes eu vinha de Interlagos todos os dias para cá, mas decidi ficar por aqui, pois todo momento bate alguém no portão trazendo novas contribuições ou ideias para projetos. Bate também para contar histórias de abuso sexual ou casos de violência doméstica”, conta.

Manoela Pontes arruma a Casa das Crioulas e dá atenção ao filho Manoel
Manoela Pontes dá atenção ao filho Manolo

Além da ajuda física, são inúmeros os contatos de pessoas que querem realizar atividades no local. Desde aulas de jazz a ateliês de costura, a maioria das sugestões vêm de mulheres que já estão se identificando com o projeto. “Há arquitetas, musicistas, designers e advogadas.”

As cores dos quatro cômodos foram escolhidas de acordo com as atividades que serão realizadas em cada espaço, no intuito de atrair as pessoas ao local. Dentre elas, uma sala destinada à oficina de corte e costura e uma para atividades educativas voltadas às crianças.  

Na sala, a biblioteca de livros sobre feminismo cresce na estante, enquanto aguarda a doação de outros volumes. “A ideia é realizar parcerias com editoras para trazer livros escritos por mulheres, assim como filmes, artes e outras áreas”, aponta. O espaço aceita todos os tipos de doações, desde livros a dinheiro.

O próximo passo é reformar o lado de fora para montar uma horta orgânica, uma serralheria e uma mercenaria. Ao lado, uma casa para crianças feita de palete. A garagem abrigará ainda um ateliê que envolva a confecção de mulheres da região, venda de obras artísticas e alimentos da horta orgânica.

Para a professora da rede pública de Perus, Maria Helena Bertolini, 52, que faz parte dos movimentos sociais do bairro desde a década de 1970, um espaço cultural que abranja, entre outras atividades, a questão da mulher em seu território, pode ser essencial para que essas mulheres possam se fortalecer e transformar suas realidades.

“Tenho certeza que a organização em grupo é um instrumento potente para as conquistas e as mulheres de Perus terão, agora, com a Casa das Crioulas, mais uma possibilidade para que as pessoas alcancem melhores condições de vida.”

Serviço:
Casa das Crioulas
Rua Mogeiro, 242, Perus – São Paulo
Página no Facebook: Casa das Crioulas – Falar com Manoela Gonçalves.

 

Jéssica Moreira, 22, é correspondente de Perus.
@gegis00
jessicamoreira.mural@gmail.com

Comentários

  1. alem de amiga, Manoela Gonçalves é uma inspiração para muitas pessoas que sofrem e lutam por ideais como o feminismo!! Casa das Crioulas promete pegar na jugular!!

  2. Parabéns pela iniciativa! Gostaria muito de conhecer o seu trabalho pessoalmente. Tudo o que vem na direção do empoderamento das mulheres de Perus será bem vindo!

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