Livro narra vida de jovem homossexual da periferia de São Paulo

Agência Mural

Negro e homossexual, Samuel de Paula, 28, descobriu desde cedo que teria pela frente um longo caminho a enfrentar.

De família evangélica, frequentava os cultos com sua mãe, irmã e pai, todas às terças, quintas, sábados e domingos, em uma pequena igreja, no Jabaquara, periferia da zona sul de São Paulo.

Aos 5 anos já sentia que era diferente dos amigos. “Quando minhas tias me perguntavam sobre ‘namoradinhas’ ou quando eu me perguntava se eu gostava de alguma menina, eram meninos e meus amigos que me vinham à cabeça”, diz.

“Nunca tive nada com ninguém durante minha infância, no máximo ‘um gostar’ ou paixão por algum coleguinha na adolescência”, completa.

Nesta segunda-feira (23), Samuel conta essa trajetória ao lançar o livro Guardei no Armário, que surgiu após o estudante ter criado um programa na internet para debater o tema.

Samuel revezava seu tempo entre a igreja e a escola, que ficava há 50 minutos de casa. Sem dinheiro para o ônibus, o calçado gasto era a locomotiva que o transportava.

Com o passar dos anos, sem referência e sem entender ao certo o que sentia, os conflitos aumentaram. “Estava crescendo sem entender quem eu era ou o que sentia. Isso foi me gerando um conflito muito grande”, diz.

Foi somente quando entrou na universidade para cursar designer gráfico por meio do ProUni, que Samuel conseguiu apoio para enfrentar seu maior desafio: assumir-se homossexual.

Aos 23 anos, ele deixou a igreja e entrou para o Purpurina, projeto de roda de debates para jovens LGBTs na ONG GPH (Grupo de Pais de Homossexuais). Com o sorriso largo e de voz mansa, não demorou para fazer amizades. Lá, conheceu outros jovens que, como ele, passavam pelos mesmos conflitos.

Em referência ao livro “Guardei no Armário”, Samuel, 28, tatuou o símbolo da obra. (Foto: Vagner Vital/Folhapress)
Em referência ao livro “Guardei no Armário”, Samuel, 28, tatuou o símbolo da obra. (Foto: Vagner Vital/Folhapress)

Nesse período, teve a ideia de criar o blog “Guardei no Armário”, onde compartilhava suas histórias com outras pessoas.

Com o tempo, não demorou para o blog virar um canal de mesmo nome, no Youtube. “Lá eu não apareço, eu entrevisto outros jovens LGBTs e deixo que eles contem suas próprias histórias. Eles são os protagonistas”, diz.

Inspirado por amigos, Samuel começou a juntar dinheiro para escrever seu próprio livro. “Muitas pessoas estão me ajudando de graça, de coração, porque acreditam nesse projeto”, diz, emocionado, enquanto faz sua primeira tatuagem, no braço direito. Um armário, símbolo da obra.

Segundo Samuel, que já acumula fãs pela internet, o objetivo é fazer com que o livro chegue também às pessoas de outras regiões periféricas e do interior do país. “O intuito é gerar um material impresso de representatividade. Temos poucos negros, gays e da periferia nesse meio [literário]”, diz.

O livro “Guardei no Armário” será lançado nesta segunda-feira (23), à partir das 18h, no Tubaína Bar (Rua Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César, São Paulo – SP).

Vagner Vital, 26, é correspondente do Jabaquara

vagnervital.mural@gmail.com

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