Moradores do Grajaú encenam histórias sobre trânsito, trens e sexualidade
“Grajaú Conta Dandaras, Grajaú Conta Zumbis”, peça da Cia. Humbalada de Teatro, põe em cena histórias cotidianas desse bairro no extremo sul da cidade.
O título faz referência a dois importantes líderes negros que combateram a escravidão no Brasil.
Em cena, são retratados o trem lotado todos os dias, o trânsito da avenida Belmira Marim (a principal do bairro), o futebol de fim de semana, o crescimento das igrejas evangélicas, a história de um rapaz que não suporta esconder sua homoafetividade, a chegada de migrantes ao bairro e
a relação dos moradores com a represa Billings.
Para participar da produção, a Cia convidou outros coletivos do distrito. “As pessoas que estão em cena são representantes da própria luta. Então tem a mulher que fala por ela, tem a bixa que fala por ela. De uma certa forma a gente tenta o lugar da representatividade”, comenta a diretora da peça Tatiana Monte, 29, moradora da região do Grajaú e uma das fundadoras da Humbalada.
Durante a peça, o público é envolvido pela movimentação das arquibancadas, pela proximidade com os atores e pelo odor de ervas maceradas. Até o paladar é aguçado no fim. “Você entra e passa por uma experiência que tem cheiro, som, cor e tato”, explica Monte.
A nudez também marca a narrativa. “A falta de experiência, a falta de rituais transforma a nudez num tabu”, diz o ator Bruno Lopes.
Esta montagem pode ser o último trabalho da Humbalada. Nascida há 13 anos quando Tatiana e Lopes se juntaram a atriz Vanessa Rosa durante o Programa Vocacional, projeto da Secretaria Municipal da Cultura que incentiva a prática da arte e ocupação dos espaços públicos, a companhia apresentou uma peça por ano.
Todas as encenações aconteceram no Grajaú, em locais como o Galpão Cultural Humbalada, em CEUs (Centro Educacional Unificado), praças ou ruas. Para se manter, o grupo busca editais públicos, mas ao menos três trabalhos foram feitos por conta própria.
A peça atual também marca o desejo de o grupo retomar hábitos do teatro de algumas décadas passadas. Tatiana recorda que na década de 1960, por exemplo, os atores geralmente faziam tudo: cenário, figurino, manutenção, direção e dramaturgia. Já atualmente a terceirização das tarefas é frequente .
“A gente queria retomar, experimentar esse outro modo de fazer produção. De ser fazedor do processo como um todo”, conta a diretora.
Galpão Cultural Humbalada – Av. Grande São Paulo, 282, Grajaú, tel. 5661-6534. 150 min. 16 anos. Sex.: 20h. Sáb.: 21h. Até 3/12. Reservas encerradas, mas serão entregues 30 ingressos uma hora antes da peça. Ingr: contribuição voluntária.
Priscila Pacheco, 28, é correspondente do Grajaú
priscilapacheco.mural@gmail.com