Moradores questionam reformas em protestos nas periferias de São Paulo
“Nada mais legítimo do que se juntar à nossa classe para protestar. Acho que essa é única arma que a gente tem: povo organizado e povo na rua!” Foi assim que Keli Domingues, 36, responsável por uma casa de atendimento à mulheres vítimas de violência doméstica, reafirmou a sua adesão à greve que ocorreu ontem (28) em diversas cidades do país.
Moradora de Guaianases, na zona leste de São Paulo, ela foi ao largo da Batata protestar contra as reformas trabalhista e da Previdência. “Me juntei a greve de hoje justamente porque eu faço parte desse grupo de trabalhadores ou da classe trabalhadora que será prejudicada com as reformas desse governo ilegítimo e golpista”, defendeu.
Para chegar ao ponto de encontro do ato, na zona oeste, Keli utilizou um ônibus fretado por coletivos da região. A quase 70 km de Guaianases, o professor e terapeuta holístico Paulo Rudo, 32, também contou com o transporte disponibilizado por movimentos sociais para sair do Grajaú, no extremo sul de São Paulo.
Entre as reivindicações do professor, estão as reformas estruturais propostas pelo governo do presidente Michel Temer (PMDB). “Que cobrem as dívidas de quem deve e mudem a aposentadoria dos parlamentares”, sugeriu Paulo.
Na opinião do morador, as alterações das leis de trabalho e a mudança de regras da aposentadoria são medidas para driblar a atual crise do sistema capitalista. “O filho da empregada doméstica não acessava a universidade. Agora ele acessa e faz a faculdade junto com o filho do patrão. Isso é algo muito interessante e curioso na história do Brasil”, diz Paulo, ao sugerir que as reformas podem reduzir direitos conquistados nos últimos anos.
Além da manifestação que reuniu mais de 70 mil pessoas no largo da Batata, a sexta-feira foi marcada por greve e manifestações em diferentes pontos da cidade e da Grande São Paulo.
Estações do Metrô e da CPTM amanheceram em operação parcial, enquanto a circulação de linhas de ônibus foi interrompida. Outras categorias, como professores, trabalhadores da saúde, bancários e comerciários, também aderiram à paralisação.
ZONA LESTE
Na zona leste de São Paulo, logo pela manhã um protesto fechou a Radial Leste. Com a presença de cerca de 100 pessoas na região de Itaquera, o ato terminou com seis manifestantes detidos.
Cinco militantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e um professor dirigente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) foram levados ao 65º DP.
Durante o dia, estiveram presentes na delegacia os deputados federais Paulo Teixeira (PT-SP) e Major Olímpio (SD-SP). O padre Paulo Bezerra, pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Itaquera, também marcou presença em apoio a liberação dos manifestantes. No entanto, o delegado deve esperar até terça-feira (2) para tratar do caso.
Em São Miguel Paulista, uma concentração saiu da praça do Forró e seguiu pela avenida São Miguel. No mesmo distrito, no entanto, um grupo de jovens da Vila Jacuí, não aderiu aos protestos e aproveitou o dia para capinar um espaço público abaixo do viaduto que dá acesso às suas moradias.
ZONA NORTE
Contra as reformas, a privatização do parque Jaraguá e o fechamento da UBS local, indígenas pediram a demarcação de terras e bloquearam a estrada Turística do Jaraguá, na zona norte de São Paulo. “Hoje eles estão dizendo que a Previdência Social vai ter que aposentar os idosos com quase 70, 80 anos. Não vai dar nem tempo da pessoa receber o seu dinheiro da aposentadoria” disse a Índia Arapoty, da Aldeia do Jaraguá, em um vídeo gravado pelo coletivo “Nós, mulheres da periferia”.
Com cartazes dizendo “nenhum direito a menos” e “vai ter luta na periferia”, um grupo de moradores de Perus caminhou pela avenida Doutor Silvio de Campos -uma das principais vias do bairro. Durante o protesto, também era possível encontrar faixas com as declarações “queixadas vivem”, fazendo alusão ao antigo movimento de luta dos trabalhadores da Fábrica de Cimento Perus.
ZONA SUL
Os protestos na zona sul começaram cedo em vários bairros. Os terminais Jardim Ângela, Capelinha, Grajaú, Guarapiranga, João Dias, Santo Amaro e Varginha permaneceram por toda manhã sem a circulação de ônibus ou a maior parte do dia com a frota reduzida.
Por volta das 6h da manhã, moradores das ocupações Nova Palestina (Jardim Ângela), Aristocrata e Anchieta (ambas no Grajaú), movimentos sociais, moradores, professores, estudantes e artistas, foram para as ruas e se encontraram no largo do Socorro. Manifestantes também bloquearam a Estrada de Itapecerica, nas proximidades da Estação Capão Redondo do Metrô.
Uma das participantes da manifestação na M’ Boi Mirim, Marilu Santos Cardoso, 40, moradora do Jardim Ângela e professora de história, diz que é testemunha da luta das pessoas que a antecederam e do esforço que tiveram para alcançar os direitos que tem.
“Sendo moradora, professora e educadora, me vi numa situação de que não sair hoje para as ruas, seria um ato de incoerência”, diz. “Foi um dos momentos mais bonitos do dia, ver a periferia se conectando, sem tumulto, com grito de ordem acompanhado por músicos que tocaram o tempo inteiro. Foi um encontro de energia em que a periferia luta em conjunto, com pessoas guerreiras que enfrentam os desafios da vida com alegria”, ressalta.
Por outro lado, também houve nos bairros reclamações por conta da falta de transporte, caso da enfermeira Simone Moraes, 40, moradora de Cidade Ademar. “Não sou a favor desse tipo de protesto, mesmo sendo um direito. Acredito que somente com trabalho e honestidade obteremos uma cidade e consequentemente um país melhor”, afirmou.
“Hoje não consegui chegar ao meu trabalho para cuidar da saúde de pessoas que dependem de mim, devido a uma paralisação do transporte coletivo em prol de direitos que não sabemos se são coerentes ou não, sem prever as consequências que áreas como a minha teriam”, reclama.
GRANDE SÃO PAULO
As paralisações também tomaram várias cidades da Grande São Paulo. Barueri e Itapevi decretaram ponto facultativo tendo em vista a greve na linha Diamante da CPTM. Pela manhã, municípios como Mauá e São Bernardo estavam sem os trolebus. No centro de Carapicuíba, a estação de trem permaneceu fechada durante todo o dia, mas as empresas Del Rey e ETT Carapicuíba não aderiram à greve.
Também houve protesto pela manhã em Mairiporã. “Eu acredito que as reformas [trabalhista e da Previdência] afetam a todos, mas muito mais quem é da periferia”, disse o professor universitário Raphael Cruz, 33, que durante o dia participou de manifestações em Mairiporã.
“Esse impacto é mais profundo para quem não tem acesso às políticas públicas, com o aumento do índice de desemprego, mais famílias estão em vulnerabilidade”, ressalta.
Em Mogi das Cruzes, manifestantes caminharam pelo centro, na rua Doutor Deodato Wertheimer, e promoveram um ato em frente a prefeitura. “É uma perversidade. Uma das intenções é flexibilizar as regras de contratos temporários e sabemos que serão os jovens e as mulheres as mais afetadas”, afirma a assessora técnica Milena Leão, 29. “Sem pressão popular estamos rendidos”.
Texto: Aline Kátia Melo, Beatriz Sanz, Dalton Assis, Diogo Marcondes, Gustavo Soares, Humberto Müller, Jéssica Moreira, Jessica Silva, Karina Oliveira, Kátia Flora, Laiza Lopes, Lívia Lima, Lucas Landin, Lucas Veloso, Mônica Oliveira, Paulo Talarico , Priscila Gomes, Priscilla Pacheco, Rafael Balago, Tamiris Gomes e Vander Ramos. Edição final: Marina Lopes e Cintia Gomes
50, 60, 70, 100 anos atrás, milhões de europeus pobres emigraram para o Brasil, o fizeram porque no Brasil se vivia melhor. Hoje milhões de brasileiros emigram, o fazem porque lá se vive melhor. Por que lá evoluiu mais do que cá! Parece que os motivos continuam, se assim for, daqui a 100 anos estaremos parecidos com a africa, mais pobres que a India.
Os motivos passam pela péssima distribuição de renda, muito pior que a da Índia, pior que a média africana. A elite espoliadora do estado se apropria da renda gerada pelos mais pobres. Funcionários do estado trabalham (força de espressão) 30 anos e recebem 20 salarios minimos durante 50 (aposentadoria + pensão), filhas de militares vivem a vida inteira sem trabalhar.
O jeito de manter essa situação é enganar o povo. Motorista de onibus fazendo greve para lutar pela aposentadoria dos promotores e juizes. O filho dele estuda em escola publica, o do juiz paga 5 mil de mensalidade.