Crianças falam da experiência de soltar pipa no Grajaú

Lucas Veloso
Thalita Monte Santo

“Vai correndo, para e bota o pipa pra subir no vento. Depois disso, deixa ele lá e vai controlando”. É assim que Miguel Paplo, 5, explica a forma correta de empinar. Ele passou as férias escolares soltando pipa com o irmão, que é o exemplo que usa para brincar.  “O meu irmão coloca lá no alto, perto da lua, ele é meu segredo para soltar pipa”, brinca.

Já Priscila Thawane, 8, acha que é importante ver o vento do dia e evitar ‘cortar’ outras pessoas durante a brincadeira.

“Tem que ver a quantidade de linha pra colocar a pipa no alto, mas é importante ver se tem vento, porque se não tiver, não dá. Um dia tava aqui e o menino veio e me ‘cortou’. Fiquei desesperada, mas não fiz nada. Nunca cortei ninguém. Acho que nunca tem que cortar os outros”, acrescenta.

Pais e filhos brincam no Parque Cantinho do Céu (Lucas Veloso/Agência Mural/Folhapress)

A receita das crianças para a brincadeira foi dada em uma tarde de domingo no parque linear Cantinho do Céu, no Grajaú, na zona sul de São Paulo, onde durante o mês de julho, o evento Revoada de Pipas teve uma oficina para estimular os pequenos a fazerem seus próprios papagaios.

No parque, quem mais solta pipas são os meninos. Entre as poucas garotas, há Kemilly Rafaela, 8. A menina pediu ao pai uma pipa rosa da Barbie. “Tive da Hello Kitty também, mas gostei mais da Barbie por ser mais bonita. Durante a semana, o que mais gosto de fazer é empinar. Faço bastante com o Kelvin [irmão dela]”, revela.

O cabeleireiro Rafael Silva, 33, usa os fins de semana para levar os filhos a lugares que considera apropriados para o lazer, como espaços sem fios elétricos e sem movimento intenso de carro. Ele, que empinava pipa quando pequeno, diz acreditar que por mais que a tradição ainda resista nos bairros, há menos criatividade na hora de brincar.

“Sempre empinei na infância. Antes, era interessante fazer o brinquedo, pois a molecada mexia com a cola, o fogo, a lata de óleo, mas hoje tudo é o plástico”, observa. “Vejo que as coisas estão mais fáceis e isso tirou parte da criatividade que fazia a gente se divertir”, completa.

O professor e educador Adolfo Souza, 37, que é um dos organizadores da Revoada de Pipas, acredita que o encontro é um meio de trazer diversão e conscientização ambiental para as crianças. Além disso, a ideia da criança produzir a própria pipa é uma maneira de criar autonomia.

“A ideia da criança fazer a própria pipa é legal porque ela foge do contexto do consumo. Ela começa a criar a independência, de fazer a própria pipa, não tão bonita, porém funcional, mas que ela fez. Porque é legal fazer a compra, potencializar o comércio local, mas para a criança, às vezes, que não tem como comprar é legal ter essa independência”, explica.

Apesar de afirmarem que pipa é brincadeira de criança, dizem acreditar que é preciso responsabilidade. Para Kemilly, é necessário tomar cuidado por causa do cerol. Já Miguel afirma que a mãe não o deixa soltar pipa com o cortante.

Lucas Veloso e Thalita Monte Santo são correspondentes de Guaianases e de Guarulhos
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