Moradores ganham renda extra com aluguel de garagens nas periferias de SP
Ira Romão
Eduardo Silva
A dona de casa Alzerina Alves de Oliveira, 58, nunca colocou uma placa de aluga-se para a garagem que tem em cima de casa. Mas há 10 anos é procurada para alugar o espaço no Jardim do Russo, em Perus, na zona norte de São Paulo.
“Desde que fechamos com portão, mesmo quando ainda não tinha laje, sempre aparece alguém perguntando se está vazia, mostrando interesse em alugar”, afirma.
A busca foi tanta que ela cedeu. Hoje, recebe R$ 80 por mês com a locação. Há vizinhos e conhecidos que também alugam garagens por preços que vão até R$ 300 e viram uma nova opção de renda.
Com as duas filhas desempregadas, Alzenira conta apenas com a aposentadoria do marido. “Esse dinheiro [do aluguel] me ajuda ao menos com as despesas diárias de casa. Muitas vezes, é com ele que compro o gás de cozinha”, explica.
Três inquilinos usaram a área ao longo da década. Todos conhecidos dela. Os acordos foram sempre apenas pela palavra do locatário e ela nunca assinou um contrato. Confiança é o que rege essas relações. “Tomo sempre cuidado para quem vou alugar. Afinal, a garagem dá acesso direto à minha casa. Penso na privacidade da minha família e na relação com o inquilino”, fala.
Ela já pensou em deixar de usar o local até por causa da obra que o marido, que é pedreiro, tem feito na casa. “Fico preocupada quando temos que carregar material de construção e o carro está na garagem. E também quando vem crianças aqui e querem brincar no quintal. Nestes momentos coloco um lençol no carro para não arranhar”, conta.
Ao longo desses 10 anos, dois meses foi o maior tempo que o espaço ficou vazio. Até hoje, mesmo com a garagem alugada, ela recebe semanalmente propostas de pessoas que passam em frente à residência, inclusive com valores mais altos.
Mesmo assim, ela mantém o acordo firmado com o atual inquilino. Num futuro próximo, sonha em finalizar a ampliação da casa e, quem sabe, uma das filhas adquira um carro.
LOCADOR
A procura por garagens segue também o fato do aumento no número de veículos na cidade. A capital conta com 5,7 milhões de carros, segundo o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), uma alta de 34% em dez anos quando mais de 1 milhão de carros foram emplacados no município.
O empresário Maurício Silva, 33, reside na mesma rua que Dona Alzerina, mas não tem garagem. No entanto, é proprietário de quatro veículos.
Ele aluga duas garagens distintas por R$ 150 e R$ 170 – cada uma comporta dois carros. Antes, chegou a pagar R$ 600 por mês com aluguel.
Duas ruas acima da casa de Maurício, reside a dona de casa Sandrelma Teotônio de Souza, 46. Ela é locatária de duas garagens.
A primeira foi planejada para isso. Há dois anos, decidiu construir uma garagem apenas para alugar. Desde que ficou pronta, está alugada para o mesmo inquilino por R$ 130.
A segunda é um espaço simples, coberto por telhas, que dá acesso à casa de Sandrelma. Um dia ela emprestou para um vizinho estacionar o carro, o que despertou interesse de outro morador. O local improvisado está alugado por R$ 100.
VILA CURUÇÁ
Quase 50 km dali, as cabeleireiras Maria de Fátima Monteiro, 56, e Sônia França, 55, alugam a garagem da casa onde moram para quatro inquilinos, no Jardim dos Ipês, distrito da Vila Curuçá, no extremo leste da capital paulista.
Ao todo, são cinco carros e uma moto que dividem o quintal das moradoras com dois cães de estimação.
O negócio começou há dois anos, sem que tivessem essa intenção. “As pessoas perguntavam se a gente poderia alugar a garagem porque o espaço aqui é grande e elas estavam deixando o carro na rua”, conta Fátima.
O primeiro inquilino foi o marido de uma cliente do salão de cabeleireiro onde as duas são sócias e, de acordo com elas, nunca houve problemas de privacidade. O locatário fica com uma cópia da chave do portão para ter mais liberdade para entrar e sair com o veículo.
Sônia destaca, contudo, que só aceita alugar para vizinhos ou conhecidos, e que o espaço já atingiu a lotação. “Às vezes, as pessoas vêm até aqui perguntar se podemos liberar mais uma vaga. Mas não tem jeito. A gente tem os cachorros, que são grandes, aí ficaria apertado para eles, fora que eles podem arranhar ou pular em cima dos veículos”, diz.
Assim como Dona Alzerina, as cabeleireiras também recebem R$ 80 pelo aluguel de cada carro. “É um preço bem abaixo do que é cobrado por aqui. Pelo o que a gente sabe, tem gente que aluga por R$ 120”, comenta Fátima.
Três quarteirões abaixo, o cabeleireiro Zima de Lima, 54, também possui um salão e aluga o espaço anexo para três pessoas. O local é um terreno que estava sem uso e há cinco anos passou a ser utilizado por dois vizinhos e pelo irmão dele, que possui uma van.
Para cada veículo, Lima cobra R$ 120. A renda extra o ajuda a pagar o plano de saúde da esposa.
Além do contrato feito diretamente com proprietários da garagem, empresas na região do Itaim Paulista, ao lado da Vila Curuçá, também oferecem estacionamentos para mensalistas.
O Itaim Park cobra R$ 150 (com horário fixo, de segunda a sábado), e o Betha Park, com o valor mensal de R$ 120 e funcionamento 24 horas.
Ira Romão é correspondente de Perus
iraromao@agenciamural.org.br
Eduardo Silva é correspondente de São Miguel Paulista
eduardosilva@agenciamural.org.br