Girlei Miranda celebra 30 anos de carreira com tambores, guitarra e baixo elétrico
Jariza Rugiano
Batuques de samba embalaram o nascimento de Girlei Luiza Miranda, 57. Os pais faziam uma festa com feijoada na Casa Verde, zona norte de São Paulo, quando ela veio ao mundo em 1962. A batucada faria parte da vida dela, que se tornou uma multiartista e completa neste ano três décadas de carreira musical.
Foi com o pandeiro que Gigi, chamada assim pelos mais chegados, se percebeu como percussionista, compositora e cantora, campos que a levaram também à contação de histórias e ao circo.
Nos dias 17 e 31 de agosto, ela apresenta o show “30 anos de Girlei Luiza Miranda e seus tambores” no teatro Commune, no bairro Consolação, às 21h.
Girlei vive na Vila Penteado, na Brasilândia, na zona norte de São Paulo. Filha de mestre de bateria, o pai dela foi cofundador de três escolas de samba em São Paulo, a Unidos do Peruche, Mocidade Alegre e Rosas de Ouro. Na última, a mãe da percussionista fazia parte da ala das baianas.
“O primeiro instrumento que chamou minha atenção e que ganhei de meu pai foi um pandeiro. A gente tinha muita acessibilidade aos instrumentos e os compositores arrumavam os enredos em casa”, diz.
Na adolescência, Gigi pensava seguir no esporte, já que gostava de jogar vôlei, ou como aeromoça por se encantar com a ideia de sempre poder viajar e conhecer novos lugares. “A música foi mais forte”, conta a percussionista.
O sonho de ser aeromoça ficou para trás, mas a atuação artística a levou a países como Áustria e Hungria. A apresentação mais recente no exterior foi em Moçambique, onde apresentou Mjiba – a boneca guerreira, fazendo parte da Trupe Liuds, de Perus, distrito do noroeste de São Paulo.
MULHERES NA PERCUSSÃO
No início, Girlei sentia que precisava mostrar um diferencial para participar de apresentações como rodas de samba. “Por ser mulher negra, passei muito pelo processo de precisar validar meu talento, principalmente por tocar um instrumento que estava sempre no foco do homem”, lembra.
Hoje, com mais mulheres tocando tambor, a artista conta que ajudou a abrir esse caminho ao lado de outras percussionistas como Dofona, Valquíria Rosa e Miriam Capua.
Ela integrou grupos como Banda-Lá no final dos anos 1970, e o Oriashé em 1997. Colaborou na fundação do bloco afro Ilú Obá de Min em 2004, onde ensina percussão. As alunas atuaram na elaboração do espetáculo que vai reunir as músicas de Girlei, todas compostas a partir do tambor e agora somadas com baixo elétrico e guitarra.
“A gente acaba sendo produto na mão de produtores. Com elas não. [As alunas] me veem como a Gigi, a professora. Isso que é mais terno. O trabalho que faço e o show que vou apresentar é principalmente para elas, e tem a ver com a cura que o toque do tambor oferece”, diz.
No Ilú Obá de Min, Gigi também compõe músicas para o Carnaval. São cerca de 450 mulheres de diversas etnias, idades e classes sociais que atuam na percussão.
ANCESTRALIDADE
Atabaques, djembês, congas e rumpi estão entre os diversos tambores afro-brasileiros tocados por Girlei e por onde ela resgata timbres ancestrais em suas composições para os orixás, como Ogum e Oxum.
“[O tambor] é fortemente ligado à ancestralidade. Os tambores estão em todos os lugares, têm os africanos, indígenas, orientais e xamânicos, por exemplo. Tem um significado espiritual, de acolhimento e de pureza. A maioria é para a cura”, descreve.
Quanto às influências de percussão que marcam a atuação musical dela, a artista aponta Tião Carvalho, Mônica Millet, Ilê Aiyê e Araketu. “Para poder ensinar, você precisa saber aprender. Tive grandes mestres que me fizeram perceber isso, como o Dinho Nascimento, Dinho Gonçalves e Lumumba”, completa.
Girlei vive com a esposa, a mãe, irmã e sobrinho em uma casa na Brasilândia. Ela sempre esteve envolvida em trabalhos e ações de cunho social com temas sobre questões raciais e de gênero. “Minhas vivências influenciam no meu jeito de fazer arte. E quando podemos contar com amigos, o trabalho se enriquece, chega com mais força em quem assiste”, descreve.
No teatro Commune, Girlei se apresentará com duas percussões feitas por ela e Bruna do Prado, com Xantille Jesus no baixo e Guilherme Maximiano/ Guima na guitarra.
A direção artística é dela e da cantora e atriz Paula Pretta. “A apresentação será variada, tem até rock in roll. Não tem como classificar em um ritmo apenas”, diz.
Os ingressos para a primeira apresentação se esgotaram e para a segunda, em 31 de agosto, seguem à venda. Se disponíveis ainda no dia, podem ser comprados até uma hora antes da apresentação, direto na bilheteria.
Jariza Rugiano é correspondente de São Bernardo do Campo
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