Artista da zona leste de SP, Victrre terá obra exposta em Paris
Larissa Darc
No dia em que Victor Seroque (Victrre), 21, desenhou pela última vez com as canetas que havia comprado, percebeu que não tinha dinheiro para repor o estoque. O estudante de artes visuais, que até então elaborava obras com materiais físicos, decidiu testar um caminho diferente.
“Fiquei um tempo sem produzir nada então comecei a fazer arte por meio de plataformas digitais. Isso mudou completamente a estética do meu trabalho”, relata.
“O meio digital também influencia muito. Gosto das possibilidades de interação que ele cria, que são muito diferentes das que tenho em exposições físicas”, ressalta.
A ousadia deu resultado. Oito meses após o início de experimentos com reproduções gráficas, uma das obras, intitulada “Inércia”, foi selecionada para figurar no Carrousel Du Louvre, centro de compras subterrâneo de Paris, na área externa próxima ao Museu do Louvre. A arte ficará exposta entre os dias 19 e 21 de outubro.
A oportunidade surgiu durante uma conversa com a curadora de arte da Atlas Violeta Cristina Bernardini, 55. “Ela estava em fase de seleção para essa feira em Paris quando enviei meu portfólio com alguns projetos. Me inscrevi, fui aprovado e contei com a ajuda da minha família e da minha namorada para pagar a taxa de inscrição, que tinha um valor bem alto”, explica.
Cristina comenta que o Carrousel Du Louvre é uma das maiores feiras de arte da Europa. Ela tinha a missão de trazer artistas de países de língua portuguesa para a exposição quando conheceu Victrre.
“Foi muito fácil selecionar o Victor. Em meio aos trabalhos que recebo, existem muitos artistas que trazem a mesma forma de pensar e com ele foi diferente”, ressalta.
Cristina diz acreditar que o trabalho digital confere ao Victor uma vantagem. “Conseguimos imprimir as obras onde estivermos. Isso facilita muito em relação ao preço e mobilidade”, afirma Cristina.
“Os traços e a forma como ele retrata o público é fantástica. Eu acredito que nos próximos anos todas as pessoas vão saber quem é Victor Seroque”.
ÍCONES PERIFÉRICOS
De acordo com Victrre, a arte escolhida faz parte de uma coleção de peças que remete ao contexto de ícones periféricos, como a pixação. Morador da Vila Dalila, localizada no distrito de Vila Matilde, tem como principal inspiração o ambiente urbano e os ícones ligados a identidade latina.
“O único aparelho cultural do meu bairro é uma escola de samba. Não existem lugares para apresentar o meu trabalho, por exemplo. Consegui expor na Europa, mas não tenho espaços artísticos aqui”, diz o rapaz.
No momento, as obras de Victrre estão em residência artística em um ateliê no centro da cidade, no Galeria SP Hostel, ao lado de produções criadas por outros artistas moradores das periferias. No caso de “Inércia”, o material foi produzido no computador e impresso em Paris para a exposição.
Filho de corretora imobiliária, que atualmente trabalha como auxiliar administrativa, Victrre exerce estágio não-remunerado ao mesmo tempo que cursa a faculdade de licenciatura em artes. “O trabalho artístico ainda é muito pessoal e quase nunca recebo um retorno financeiro”, justifica.
Apesar de ter o talento reconhecido por uma instituição estrangeira, o jovem, que nunca saiu do Brasil, não estará presente na exposição em Paris.
“Não tenho condição financeira para viajar até a Europa para ver o meu trabalho exposto, mas acho massa que pelo menos a minha obra esteja chegando em outros lugares”, comenta. “O meu trabalho, literalmente, chegou antes de mim”.
Larissa Darc é correspondente do Parque do Carmo