Com pandemia, eleições podem ter mais sujeira virtual do que pelas ruas

Paulo Talarico

Pelo WhatsApp, pré-candidatos a vereador têm conversado com moradores pela Grande São Paulo, enquanto prefeitos apresentam obras nas redes sociais com inaugurações virtuais. 

Com a necessidade do isolamento social – ainda em vigência oficialmente – o uso das redes sociais pode ganhar mais força e provocar mudanças no jeito de fazer campanha nas eleições deste ano. A menos de quatro meses da disputa, essa sensação já tem sido vista. 

Ao contrário das últimas votações pelas prefeituras e câmaras municipais, a pré-campanha eleitoral está mais tímida pelas periferias da capital e da Grande São Paulo. 

Nos últimos anos, nessa época era comum ver placas de agradecimento pipocarem pelos bairros, com vereadores e prefeitos “recebendo” a gratidão pública da população. 

Na realidade, embora negado pelos políticos, era o jeito que encontravam de fazer propaganda antecipada e driblar a lei eleitoral. Esse mecanismo ainda aparece, mas a pandemia tem limitado esse tipo de ação.

Outro ponto que pode ser afetado será a própria campanha, que começa oficialmente em 26 de setembro (a votação foi adiada para 15 de novembro). Com os riscos de transmissão da doença, os tradicionais santinhos terão o mesmo peso de antigamente?

Nas últimas eleições, tentamos mostrar o uso desse tipo de propaganda teve na eleição. Fizemos algo artesanal. Mais de 10 correspondentes contabilizaram quantos panfletos foram entregues nas casas dos moradores. 

Espalhados pelas periferias, cada um guardou o material recebido. Isso quando conseguiam salvar os santinhos dos cachorros que se divertiam destruindo os papéis.

Na corrida eleitoral de 2016, era possível cobrir uma pessoa inteira com os papéis enviados pelos políticos durante a campanha, com casas que receberam até 200 santinhos em 20 dias. 

Dois anos depois, na eleição presidencial, de governadores, deputados e senadores, já foi possível sentir um movimento ainda maior dos políticos para as redes sociais. Porém, parte dos candidatos não deixou de lado a tática e seguiu enviando o santinho de esperança para os moradores.

Desta vez, acompanhamos por 45 dias. O recorde foi de 91 santinhos em uma única casa. A maioria dos que mais mandaram santinhos foi reeleita naquele ano.

EM QUARENTENA

Chegamos a 2020 e a pandemia de Covid-19 mudou tudo e traz outra característica. Além das formas de propaganda, o que foi feito para combater a pandemia em cada região tende a ser explorado

Pela Grande São Paulo, por exemplo, ao menos seis prefeitos tiveram diagnóstico de que estavam com coronavírus. Cada um usou de uma forma distinta a situação. 

O prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando (PSDB) se tratou na cidade vizinha, em São Caetano do Sul, e gravou um vídeo do leito do hospital para falar da enfermidade. 

Outros aproveitaram para mostrar o serviço de saúde da própria cidade. 

O deputado estadual Marmo Cezar (PSDB) se recuperou da Covid-19 e a situação foi divulgada pela gestão municipal. A saída dele do hospital de campanha foi filmada, marcada pelo encontro dele com o filho, Elvis, que é o prefeito da cidade. 

Ao sair curado, com salva de palmas dos profissionais da saúde, o deputado diz que “graças a você filho e a essa estrutura” estava bem e agradece aos servidores da unidade.

A mesma coisa fez o prefeito de Cajamar, Danilo Joan (PSD), que deve disputar a reeleição. “Agora posso dizer que sou mais um que venci a Covid-19, graças a Deus e ao excelente atendimento dos médicos e enfermeiros de Cajamar”, propagandeou.

Por outro lado, a atuação na Covid-19 também terá peso no caso de quem atuou durante a pandemia nas periferias. Nomes oriundos de movimentos sociais e que atuaram nas redes de solidariedade para levar alimentos e produtos de higiene aos moradores podem ser lembrados. 

É nesse campo também que parte dos atuais vereadores trabalhou para tentar se manter mais quatro anos no legislativo. A eleição deste ano será em 15 de novembro. 

Paulo Talarico é cofundador e editor-chefe de jornalismo da Agência Mural de Jornalismo das Periferias
paulo@agenciamural.org.br