Os rótulos criados para quem produz notícia sobre as periferias

Cíntia Gomes

São muitos os adjetivos que ouvimos quando as pessoas tentam explicar o que fazemos. Já fomos apresentados como uma organização de jornalismo cidadão, comunitário, ativista, popular, alternativo, periférico, local, hiperlocal e independente.  

Mesmo sendo um veículo online composto por jornalistas e outros profissionais formados nas universidades da Grande São Paulo, parece que produzir notícias sobre as periferias nos coloca em um lugar fora ou “especial” do jornalismo.

Sempre tenho de responder alguma pergunta sobre se antes da Agência Mural eu era líder comunitária ou ativista da “minha comunidade”. 

Jornalistas contam os desafios de empreender e fazer jornalismo independente no Brasil durante Congresso (Alice Vergueiro)

Nossa principal estratégia, para nos aproximarmos das regiões que cobrimos com contexto, desde o início, foi formar e contar com uma rede de correspondentes locais que são necessariamente residentes dos bairros e das cidades que cobrem.

São especialistas em suas regiões e usam as ferramentas e os princípios do jornalismo de boa qualidade para contar as histórias que ninguém conta. 

São eles que trazem fatos que não têm visibilidade para a maior parte da imprensa e da audiência da região metropolitana. E isso continua sendo relevante tanto para quem mora nas periferias, como para quem as desconhece e tem visão equivocada dessas áreas, antes traduzida só em histórias de escassez e/ou violência.

Nós temos um compromisso com as regiões geográficas que cobrimos, mas acima de tudo temos um compromisso ainda maior com os moradores e as moradoras delas, nossa audiência.

Porque, além de tudo, tentamos romper com o jeito rápido (e talvez mais “eficiente”?) de colher informação e contar histórias que chegam até nós pelas assessorias de imprensa das fontes oficiais –ou daquelas que podem pagar para ter uma assessoria.

Brasilândia, na zona sul de SP. Jornalismo sobre as periferias é só jornalismo (Ira Romão/Agência Mural)

Nosso foco e dedicação é ouvir nossos vizinhos e vizinhas, nossos familiares, nossos amigos e amigas, os estranhos e as estranhas que cumprimentos na rua para saber, de verdade, o que está acontecendo no nosso bairro e chamar a atenção para essas realidades. 

Para nós é muito claro o que fazemos, e embora as nomenclaturas existam, é sempre bom reforçar: o que fazemos é só jornalismo!

Cíntia Gomes é jornalista, cofundadora e diretora institucional da Agência Mural de Jornalismo das Periferias. 

cintia@agenciamural.org.br

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