Busca por diversidade e obras aceleradas só agora marcam eleições nas periferias
Paulo Talarico
Duas mulheres negras. Apenas duas. Este é o número de vereadoras que já estiveram na Câmara de São Paulo ao longo da história. Este ano, estreantes na disputa tentam mudar esse perfil e ampliar a diversidade do legislativo.
Pela Grande São Paulo, há um apagão de mulheres eleitas, com 12 câmaras sem nenhum parlamentar. Além disso, em algumas regiões em 20 anos nenhuma mulher foi eleita prefeita.
A votação no próximo domingo (15) definirá os vereadores e se haverá segundo turno. Será que 2020 mudará essa falta de representatividade?
Essa ausência ajuda a explicar a forma como as periferias são vistas ao longo dos anos na política municipal, muitas vezes tratadas apenas como moeda de troca por emendas.
Em um ano de pandemia de Covid-19, em que os bairros afastados do centro foram ainda mais afetados pela desigualdade social, o aumento no número de mulheres, de negros e negras, de indígenas, de candidaturas coletivas para a Câmara de São Paulo, é um exemplo de como cada vez mais as periferias exigem sua participação no poder de decisão.
Porém, na prática, o próximo domingo ainda tem desafios não superados que ajudam a manter a mesma estrutura política.
Os repasses de campanha, por exemplo, em partidos de todos os espectros, são destinados a quem já tem mandato. A lógica é justamente de tentar manter a cadeira já conquistada pela legenda.
Com as campanhas mais tímidas por causa do coronavírus, menos circulação nos bairros, menos políticos pedindo voto na feira, quem já está na Câmara e tem estrutura, saiu na frente. Ganha vantagem também pelo risco de mais gente não ir votar, por causa da situação dos últimos meses.
Infelizmente, o dinheiro pesa. Tanto para vereador quanto para prefeito.
Candidatos à reeleição, por exemplo, tem usado e abusado dos papéis enviados para casa dos moradores. Muitas vezes parece haver só um nome concorrendo na cidade.
Sem horário de propaganda eleitoral na TV, a situação é ainda mais difícil. Correspondente de Itaquaquecetuba, Lucas Landin conta que, em geral, por lá, eles sabem quem vai ganhar por causa do tamanho da coligação – raramente quem tem o maior número de partidos perde, pois é praticamente o único a aparecer.
Fecha essa conta o mais antigo dos “golpes” de quem está no poder: as obras em cima da hora. Quem não viu por aí um asfalto novo esses dias? Em São Paulo, obras arrastadas na saúde e na educação durante anos estão sendo feitas a toque de caixa este ano.
Em Osasco, também não faltam exemplos. Tão rápido tem sido o recapeamento que várias vias estão sem faixa. Por outro lado, obras antigas como as enchentes seguem como esperança apenas.
Nos debates, ainda houve candidatos que criminalizam a cultura e minimizaram o impacto da pandemia. Tanto que algumas lideranças comunitárias têm evitado contato com os atuais aspirantes na disputa, justamente pela falta de apoio.
Sem ampliar essa diversidade é difícil que políticas importantes avancem nas câmaras e que preconceitos sejam quebrados.
Evidente que os problemas das periferias não serão resolvidos apenas com a eleição, independente do resultado. Porém, é difícil pensar em mudança ou transformação na política, se aqui em minha cidade, Osasco, durante os dias em que morriam ainda mil pessoas por dia, teve até gramado sintético contratado para sair agora no final de ano. Mesmo sem bola.
Paulo Talarico é cofundador e editor-chefe de jornalismo da Agência Mural de Jornalismo das Periferias
paulo@agenciamural.org.br
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