Aglomerações em festas são mais perigosas que as do transporte público?

Paulo Talarico

Desde o final de ano, as festas de Natal e ano novo ligaram o sinal de alerta de que mais contaminações por Covid-19 poderiam vir. Desde então, a aglomeração em pancadões tem sido apontada como vilã principal das cadeias de contágio. Mas é possível colocar apenas nas festas a culpa pelo momento em que voltamos a registrar quase 1.500 mortes por dia?

No final de 2020 as pessoas lotaram os principais centros comerciais das cidades. Após um ano de tantas perdas econômicas, muitos não fecharam sua loja, seu bar e sua lanchonete, tentando garantir o sustento.

No Natal e ano-novo, e nos fins de semana de janeiro, novas medidas da quarentena como o fechamento dos comércios nos fins de fins de semana foram implementadas no estado de São Paulo, tentando conter o avanço da doença. 

Além disso, houve redução no valor do auxílio emergencial e o fim dele neste começo de ano, culminando com a maior procura de pessoas pelo trabalho informal e assim voltarem a ocupar as ruas: tudo isso leva a mais exposição ao vírus. 

Por fim, a realidade do home office tem sido cada vez menor. Em novembro, segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) 7,3 milhões de pessoas trabalhavam de casa, uma redução de 260 mil em um mês.

A possibilidade de se manter isolado tem se reduzido cada vez mais, o que leva mais gente para o transporte público. 

A SPtrans afirma que os estudos feitos pela Prefeitura de São Paulo indicam que o risco de pegar Covid-19 não aumenta nesses casos. “A proporção de pessoas infectadas no transporte público é a mesma de quem não o utiliza. Por isso, não há relação entre usar o transporte público e ser infectado”, afirmou a empresa à Agência Mural. Será?

Conversamos ao longo das últimas semanas com alguns jovens que têm ido a festas e participado de aglomerações. Algumas respostas são interessantes: alguns afirmam que têm ido aos espaços porque não sentem que a doença atingiu tantos moradores por perto –ainda há muita desinformação, infelizmente. 

Outros questionam justamente como tomar as medidas de proteção. Se pego um busão lotado e não me contamino, será diferente no baile? Uma casa com um cômodo onde vivem várias pessoas que têm de sair para conseguir renda todos os dias é mais segura do que uma festa onde você passa poucas horas? 

De todo modo, usar máscara, lavar as mãos e evitar aglomerações são sim cuidados do dia a dia para evitar contágios e proteger mais vidas. 

Ao mesmo tempo, é preciso colocar tudo no pacote. A juventude que participa das festas não pode ser apontada como o único vilão da propagação do coronavírus. Um país extremamente desigual que impede que boa parte das famílias se proteja –por todos os motivos acima– é sim o que precisa ser enfrentado.

Paulo Talarico é cofundador e editor-chefe de jornalismo da Agência Mural de Jornalismo das Periferias
paulo@agenciamural.org.br