A união do jornalismo em um universo de desinformação

Paulo Talarico

Em abril, Anderson Meneses escreveu aqui no blog sobre como o jornalismo é feito pelas mãos de muitos. Comparou naquele dia com o trabalho de encher uma laje – algo que não dá para fazer sozinho. 

Esse princípio tem sido reforçado cada vez mais. Primeiro de como o jornalismo precisa dialogar com seu público, mas nos últimos tempos a união tem sido reforçada também entre os jornalistas.

A pandemia de Covid-19 e os ataques constantes à democracia têm tido como resposta o fortalecimento desse movimento inverso. A colaboração entre diferentes organizações jornalísticas. 

Exemplos como o consórcio de imprensa criado para garantir a divulgação de dados sobre casos e mortes por Covid-19 tem se multiplicado, com a ideia de juntar esforços para conseguir ter mais alcance tanto na investigação jornalística quanto na audiência.

Entre os pontos positivos está a união de trabalhos que têm experiências distintas e que podem contribuir para garantir uma cobertura melhor. Nas periferias não têm sido diferente. Organizações que atuam com a cobertura desses bairros têm buscado ampliar suas apurações com apoio de outros meios. 

Aqui na Agência Mural nosso nascimento como este blog há 10 anos sempre teve esse espírito – pensando numa organização que produz pautas que saiam em outro veículo.

Com o tempo, esse contato foi ampliado e atualmente temos reportagens publicadas no jornal frequentemente, assim como temos feito parcerias para contar histórias como quanto foi gasto para colocar pedras embaixo de um viaduto para afastar moradores de rua

Outros parceiros também foram essenciais para avançarmos. Em maio, publicamos uma reportagem sobre o avanço das igrejas evangélicas nas periferias. Contamos na época com apoio do Pindograma, site de jornalismo de dados, para conseguir mapear o crescimento delas em periferias de São Paulo e com nossa rede de correspondentes ouvir os moradores sobre o que significa essa presença.

Já com o Lagom Data, trabalhamos com a desigualdade entre negros e brancos na vacinação na cidade de São Paulo.

Recentemente, ao lado do Nós, mulheres da periferia, abordamos a situação de prostitutas que vivem nas periferias e como a vida delas foi afetada pela pandemia. 

No ano passado, participamos do MonitorA, projeto realizado pela Revista AzMina, e pudemos mostrar como os ataques virtuais contra lideranças políticas também afetam os bairros mais afastados do centro.

Na mesma eleição, fizemos algumas oficinas com a Énois – Laboratório de Jornalismo para nossa rede de correspondentes que geraram pautas – também por meio dessa união levamos as notícias para os carros de som pelas ruas das periferias.  

Outro exemplo foi a participação no Comprova, no qual participamos de um consórcio para a verificação de notícias falsas na internet. 

Essa união também na periferia é importante para quem tem poucas informações de qualidade sobre seus territórios. E vai ser essencial para o ano de 2022, quando teremos as eleições, e quando sairmos da crise pandêmica, dado o agravamento das desigualdades sociais.

O surgimento da Ajor (Associação de Jornalismo Digital) é uma demonstração disso. Criada em 7 de junho por cerca de 30 organizações (entre elas a Mural), a associação quer o fortalecimento do jornalismo brasileiro, por meio da profissionalização, a defesa do jornalismo e da democracia, criação de ferramentas de defesa legal e a promoção da diversidade. 

Levantamento da Ong Repórteres Sem Fronteiras indica que o Brasil é apenas o 111º em liberdade de imprensa no mundo. No ano passado, houve mais de um ataque à imprensa por dia só por parte de integrantes e apoiadores do governo federal. 

Estar junto será fundamental para garantir a manutenção do bom jornalismo. 

Paulo Talarico é editor-chefe da Agência Mural