O primeiro evento com mais de mil pessoas após 18 meses de quarentena
Caê Vasconcelos
Nesta última terça-feira (05), deixei o medo de lado e fui ver o Osasco Voleibol Clube, meu time de vôlei do coração, jogar no Ginásio Esportivo José Liberatti, em Osasco, na região metropolitana de São Paulo. E valeu a pena ter enfrentado minha insegurança inicial.
Foi bonito ver a juventude, com cautela, tentando recuperar espaços públicos. Como jornalista, deu vontade de fazer algumas entrevistas, mas desisti. Decidi tornar aquela experiência neste texto em primeira pessoa.
A gente sabe que a pandemia do coronavírus não acabou, muita gente ainda não se vacinou, mas, de fato, a vacinação avançou. Por isso alguns lugares e eventos estão sendo reabertos. Como os jogos de vôlei nos ginásios.
Eu sempre fui fã de esportes, principalmente vôlei e futebol feminino, mas as Olimpíadas de Tóquio, e o agravante de estar trancado em casa há tanto tempo, despertaram em mim uma vontade enorme de assistir mais jogos presencialmente. Prometi para mim mesmo que, assim que pudesse, iria a todas as partidas que eu pudesse.
A pandemia pra mim foi uma espécie de renascimento (principalmente por conta da minha transição social de gênero), e tendo refletido sobre aproveitar os momentos únicos como uma obrigação. Mas eu não imaginava que fosse viver isso ainda em 2021.
Quando o Osasco anunciou nas redes que o primeiro jogo da semifinal do Campeonato Paulista, contra o Pinheiros, seria no Liberatti, e que teria torcida, minha primeira reação foi de crítica. “Será que é hora pra isso? A pandemia ainda não acabou, nem todo mundo se vacinou.”
Aí veio o anúncio das regras para que a torcida pudesse comparecer ao jogo e fiquei mais tranquilo: só entraria no ginásio quem tomou pelo menos uma dose da vacina, com apresentação de um teste negativo da Covid-19, máscaras obrigatórias durante toda a partida e limite de 30% do público. Deu um alívio. Decidi que iria.
Domingo os ingressos foram liberados para venda, e em duas horas esgotaram-se. Para quem não sabe, os jogos de vôlei são gratuitos até as partidas finais. Aliás, está aí um lazer bem massa pra você fazer e ainda ajuda a fortalecer o esporte feminino.
Bateu uma ansiedade do momento que garanti meu ingresso até quando saí de casa na terça à noite. Quando chegou o momento de ir para o ginásio, meus sentimentos eram contraditórios: euforia e medo. Sabia que os protocolos sanitários seriam respeitados no jogo, mas os ginásios são locais fechados. Fui.
Além de ser o primeiro jogo pós-quarentena, era o meu primeiro jogo pós-transição social de gênero, com uma coincidência: nesta temporada, a única jogadora trans de vôlei no Brasil entrou para o meu time. Imagina a ansiedade deste torcedor trans? Ver Tifanny Abreu pela primeira vez usando a camiseta do meu time (e marcando muitos pontos) foi uma emoção a mais.
Quando entrei no ginásio o jogo já estava para começar. Encontrei uma cadeira em uma fileira mais vazia: o distanciamento estava sendo seguido “como dava”, pulando umas cadeiras dos lados, e nem sempre dava pra pular na frente ou atrás, por conta da geografia do espaço. Até onde meus olhos conseguiam olhar, as 1.200 pessoas ali usaram máscara do começo ao fim do jogo.
Nem lembrava mais como era ouvir música tão alto, deu uma leve atordoada no começo, mas depois (re)acostumei. E ouvir os gritos da torcida? Nem sei explicar a sensação que foi! Mil pessoas gritando “vamos, Osasco!” e “oh oh oh oh, nós somos Osasco, campeão mundial”.
Como disse no começo deste texto, eu até cogitei conversar com algumas pessoas na torcida, mas a emoção do momento foi tão grande que parecia muito errado atrapalhar aquele momento único na vida de cada uma daquelas pessoas que, finalmente, saíram de casa pra ver o Osasco fora das telas.
Deu tudo muito certo: o Osasco ganhou por 3 sets a 0 do Pinheiros em um jogo lindo de se ver (e de torcer). Com prudência e cautela, por enquanto, esperando que toda a população receba a sua segunda dose e que, em breve, possamos falar de um período “pós-pandemia”.
Caê Vasconcelos é correspondente da Agência Mural