Mural https://mural.blogfolha.uol.com.br Os bastidores do jornalismo nas periferias de SP Mon, 27 Dec 2021 13:12:41 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Girlei Miranda celebra 30 anos de carreira com tambores, guitarra e baixo elétrico https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/08/15/girlei-miranda-celebra-30-anos-de-carreira-com-tambores-guitarra-e-baixo-eletrico/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/08/15/girlei-miranda-celebra-30-anos-de-carreira-com-tambores-guitarra-e-baixo-eletrico/#respond Thu, 15 Aug 2019 12:05:22 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/08/Girlei-ensaiando-para-os-shows-de-17-e-31-de-agosto-que-celebram-os-30-anos-de-sua-trajetória-musical-III_Divulgação-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=16652 Jariza Rugiano

Batuques de samba embalaram o nascimento de Girlei Luiza Miranda, 57. Os pais faziam uma festa com feijoada na Casa Verde, zona norte de São Paulo, quando ela veio ao mundo em 1962. A batucada faria parte da vida dela, que se tornou uma multiartista e completa neste ano três décadas de carreira musical.

Foi com o pandeiro que Gigi, chamada assim pelos mais chegados, se percebeu como percussionista, compositora e cantora, campos que a levaram também à contação de histórias e ao circo. 

Nos dias 17 e 31 de agosto, ela apresenta o  show “30 anos de Girlei Luiza Miranda e seus tambores” no teatro Commune, no bairro Consolação, às 21h. 

Girlei vive na Vila Penteado, na Brasilândia, na zona norte de São Paulo. Filha de mestre de bateria, o pai dela foi cofundador de três escolas de samba em São Paulo, a Unidos do Peruche, Mocidade Alegre e Rosas de Ouro. Na última, a mãe da percussionista fazia parte da ala das baianas. 

“O primeiro instrumento que chamou minha atenção e que ganhei de meu pai foi um pandeiro. A gente tinha muita acessibilidade aos instrumentos e os compositores arrumavam os enredos em casa”, diz.

Girlei Miranda na Oficina Cultural Oswald de Andrade durante entrevista para a Agência Mural_(Jariza Rugiano/Agência Mural/Folhapress)

Na adolescência, Gigi pensava seguir no esporte, já que gostava de jogar vôlei, ou como aeromoça por se encantar com a ideia de sempre poder viajar e conhecer novos lugares. “A música foi mais forte”, conta a percussionista.

O sonho de ser aeromoça ficou para trás, mas a atuação artística a levou a países como Áustria e Hungria. A apresentação mais recente no exterior foi em Moçambique, onde apresentou Mjiba – a boneca guerreira, fazendo parte da Trupe Liuds, de Perus, distrito do noroeste de São Paulo.

MULHERES NA PERCUSSÃO

No início, Girlei sentia que precisava mostrar um diferencial para participar de apresentações como rodas de samba. “Por ser mulher negra, passei muito pelo processo de precisar validar meu talento, principalmente por tocar um instrumento que estava sempre no foco do homem”, lembra. 

Hoje, com mais mulheres tocando tambor, a artista conta que ajudou a abrir esse caminho ao lado de outras percussionistas como Dofona, Valquíria Rosa e Miriam Capua.

Ela integrou grupos como Banda-Lá no final dos anos 1970, e o Oriashé em 1997. Colaborou na fundação do bloco afro Ilú Obá de Min em 2004, onde ensina percussão. As alunas atuaram na elaboração do espetáculo que vai reunir as músicas de Girlei, todas compostas a partir do tambor e agora somadas com baixo elétrico e guitarra.

Girlei é uma das cofundadoras do Ilú Obá de Min, grupo com mais de 400 mulheres (Eliária Andrade/Divulgação)

“A gente acaba sendo produto na mão de produtores. Com elas não. [As alunas] me veem como a Gigi, a professora. Isso que é mais terno. O trabalho que faço e o show que vou apresentar é principalmente para elas, e tem a ver com a cura que o toque do tambor oferece”, diz.

No Ilú Obá de Min, Gigi também compõe músicas para o Carnaval. São cerca de 450 mulheres de diversas etnias, idades e classes sociais que atuam na percussão.

ANCESTRALIDADE

Atabaques, djembês, congas e rumpi estão entre os diversos tambores afro-brasileiros tocados por Girlei e por onde ela resgata timbres ancestrais em suas composições para os orixás, como Ogum e Oxum.

“[O tambor] é fortemente ligado à ancestralidade. Os tambores estão em todos os lugares, têm os africanos, indígenas, orientais e xamânicos, por exemplo. Tem um significado espiritual, de acolhimento e de pureza. A maioria é para a cura”, descreve. 

Quanto às influências de percussão que marcam a atuação musical dela, a artista aponta Tião Carvalho, Mônica Millet, Ilê Aiyê e Araketu. “Para poder ensinar, você precisa saber aprender. Tive grandes mestres que me fizeram perceber isso, como o Dinho Nascimento, Dinho Gonçalves e Lumumba”, completa.

Girlei acompanhada de banda durante ensaio para o show que marca 30 anos de carreira como percussionista e compositora (Divulgação)

Girlei vive com a esposa, a mãe, irmã e sobrinho em uma casa na Brasilândia. Ela sempre esteve envolvida em trabalhos e ações de cunho social com temas sobre questões raciais e de gênero. “Minhas vivências influenciam no meu jeito de fazer arte. E quando podemos contar com amigos, o trabalho se enriquece, chega com mais força em quem assiste”, descreve.

No teatro Commune, Girlei se apresentará com duas percussões feitas por ela e Bruna do Prado, com Xantille Jesus no baixo e Guilherme Maximiano/ Guima na guitarra. 

A direção artística é dela e da cantora e atriz Paula Pretta. “A apresentação será variada, tem até rock in roll. Não tem como classificar em um ritmo apenas”, diz.

Os ingressos para a primeira apresentação se esgotaram e para a segunda, em 31 de agosto, seguem à venda. Se disponíveis ainda no dia, podem ser comprados até uma hora antes da apresentação, direto na bilheteria.

Jariza Rugiano é correspondente de São Bernardo do Campo

VEJA TAMBÉM:

Escola na Brasilândia faz ações contra homofobia

Movimento na Brasilândia cobra retorno de obras do metrô

Na Brasilândia, empreendedora transforma calçados em arte e conquista MCs

 

]]>
0
Médico boliviano atende na periferia de São Paulo e busca especialização https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/01/25/medico-boliviano-atende-na-periferia-de-sao-paulo-e-busca-especializacao/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/01/25/medico-boliviano-atende-na-periferia-de-sao-paulo-e-busca-especializacao/#respond Fri, 25 Jan 2019 11:24:59 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/01/Imagem-1-Oliver-Flores-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=15425 Gabriel Sousa

Durante a infância, um dos grandes prazeres de Oliver Quispe Flores, 28, era brincar com os instrumentos de trabalho no consultório do padrinho, que era médico. “Gostava de ver as ampolas de remédios, gostava até do cheiro. Ele tinha livros que eu pegava pra ler”, relembra.

Em meio às brincadeiras, ele não imaginava que o futuro lhe reservaria a mesma profissão – muito menos que a exerceria fora da Bolívia.

Desde abril, Oliver trabalha como médico de família na UBS Jardim Eliza Maria, na região da Brasilândia, zona norte de São Paulo.

Ele é um dos imigrantes que escolheram a cidade, que faz 465 anos nesta sexta-feira (25), como nova moradia.

Bolivianos são os estrangeiros que mais vêm para a capital paulista, seguidos pelos chineses. Entre 2001 e 2017, foram 83.497 bolivianos, de acordo com a Polícia Federal.

De acordo com o “Atlas Temático” elaborado pelo Observatório das Migrações, da Unicamp, 783 médicos bolivianos trabalhavam no estado de São Paulo em abril do ano passado.

PERIFERIA DE COCHABAMBA

Oliver classifica a infância em Cochabamba, onde cresceu junto dos pais e dos irmãos mais novos, como “a infância normal da Bolívia”. Dividido entre trabalho e estudo, desde cedo teve de ajudar os pais vendendo salgados nas feiras da cidade. Eles viviam na periferia do município. 

“Trabalhei sério mesmo desde os 10 anos, quando comecei a saber mexer com forno. Ia comprar sozinho no mercado algumas coisas, carregava sacos de vários quilos na cabeça”, conta.

“Para mim era normal, a maioria das crianças da Bolívia têm a mesma infância que a minha, a maioria trabalha”, recorda. De fato: desde 2014, a legislação boliviana prevê exceções para o trabalho de crianças a partir de 10 anos.

Na adolescência, Oliver começou a considerar se aventurar na área médica. A mãe, no entanto, não botava fé de que os anseios do garoto pudessem ser algo além de sonhos. “Ela falava: ‘ah não, filho, estuda algo no seu nível ou algo que dê grana. Algo mais prático'”, relembra.

Oliver morou na periferia da cidade onde nasceu, na Bolívia (Gabriel Sousa/Agência Mural/Folhapress)

A participação na Olimpíada Iberoamericana de Biologia, aos 16 anos, foi fundamental para a formação de Oliver. “O professor disse: ‘Vai ter uma olimpíada de biologia na cidade. Quem quiser ir, vai para conhecer mesmo, porque eu sei que nenhum de vocês vai passar’”, conta.

Contrariando a previsão do professor, Oliver ficou em quinto lugar na fase local, em primeiro na fase nacional e representou a Bolívia na fase internacional, na Cidade do México, em 2007.

Ingressou em 2009 no vestibular da Universidade Maior de San Simón, uma das mais prestigiadas da Bolívia e que atrai muitos brasileiros.

A Digemig (Direção Geral de Migração) da Bolívia aponta que pelo menos 25 mil brasileiros estudavam medicina no país no segundo semestre de 2018, a maioria nas cidades de Cochabamba e Santa Cruz de La Sierra.

O processo lá é diferente: para entrar na universidade os estudantes fazem um curso preparatório de um ano, uma espécie de cursinho. Ao final, fazem a prova classificatória. Para certas áreas, o processo pode ser concorrido. “Acho que na minha turma começamos em 6 mil para medicina e no final do ano estávamos em cerca de 200”, explica Oliver.

Concluída a formação, em 2015, os planos eram ir para o Canadá ou Espanha, mas faltava recursos. A amiga de faculdade Nadir Ramirez, 31, sugeriu que fossem para a Argentina, onde trabalharam por um ano e meio em Buenos Aires. 

Durante a estadia em Buenos Aires, Nadir sugeriu que viessem para o Brasil. No começo de 2017 já tinha em mãos a aprovação do exame para exercer a profissão aqui, mas a amiga foi reprovada.

Ele adiou a vinda e chegou em outubro do ano passado. “Fiquei em um motel ali na Luz, não conhecia ninguém. Depois procurei um lugar para alugar pelo Facebook, achei uma coisa ali na Penha”, diz.

Com o trabalho na UBS Jardim Eliza Maria, mudou-se para a Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte. 

BOLIVIANOS EM SÃO PAULO

Apesar da presença de compatriotas na cidade, Oliver comenta ter pouco contato com outros imigrantes. “O pessoal boliviano, você deve ter percebido, é meio fechado. Mas acho que é por conta das condições em que muitos trabalham”, explica Oliver. “Tenho só dois ou três conhecidos bolivianos, mas eles estão numa situação social similar à minha”, diz.

De acordo com o Atlas Temático, 31% dos bolivianos com contrato de trabalho no Brasil até 2015 tinham no mínimo formação superior.

Apesar disso, segundo o Censo 2010, o último disponível, 42,6% dos bolivianos na região metropolitana de São Paulo trabalham como operadores de máquina de costura. O setor foi alvo de diversas ações no Ministério Público do Trabalho por conta de exploração análoga à escravidão. 

A meta de Oliver agora é iniciar a pós-graduação em infectologia pelo hospital Emílio Ribas. Para tanto, estuda por conta própria nos tempos livres da rotina de 30 atendimentos diários. “A gente tenta estudar. A maioria dos que estudam medicina no Brasil contam com recursos dos pais, não trabalham”, diz.

O interesse pela especialização surgiu durante a graduação. “Na Bolívia ainda temos muitas doenças infecciosas. Crianças ainda morrem por diarreia, pneumonia, o que não é o caso do Brasil. A maior causa de morte lá é por doenças infecciosas”, explica.

Embora queira voltar ao seu país para aplicar os futuros conhecimentos, ele faz ressalvas pela situação política. O país terá uma nova eleição e há questionamentos sobre a legalidade de uma nova candidatura do atual presidente, Evo Morales

“Gostaria de voltar porque é o meu país, a minha terra. Mas se as condições não favorecerem, eu prefiro ficar aqui ou em outro país, continuar desenvolvendo trabalhos, oferecendo serviços”, diz Oliver.

Gabriel Souza é correspondente do Jardim Elisa Maria
gabrielsousa@agenciamural.org.br

VEJA TAMBÉM:

Ao domingos, mulheres bolivianas se reúnem para jogar futebol na zona norte

Fé e assistência atraem imigrantes a igreja evangélica

]]>
0
Escola na Brasilândia faz ações contra homofobia https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/14/escola-na-brasilandia-faz-acoes-contra-homofobia/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/14/escola-na-brasilandia-faz-acoes-contra-homofobia/#comments Wed, 14 Nov 2018 20:37:01 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/WhatsApp-Image-2018-11-14-at-18.09.29-320x213.jpeg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14882 Letícia Marques

Na escola Professor Joaquim Luis de Brito quase ninguém conhece Thiago Bassini, 17, pelo nome de registro. Todos, inclusive professores, chamam pelo nome que escolheu para dar início a carreira de drag queen:  Danielle Radija.

Ela estuda na Vila Itaberaba, no distrito da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, após ter passado por escolas perto de onde mora, na Freguesia do Ó.

No colégio, diz ter encontrado acolhimento e apoio para assumir a vontade que sempre teve. “Sofri muito nas outras escolas em que passei. Precisava de ajuda e ninguém me estendeu a mão, foi bem difícil. E aqui no Brito, me senti abraçada por todos”, comenta Radija.

A estudante foi uma das organizadoras do Brito Sem Homofobia, evento realizado em outubro, com objetivo de combater a homofobia dentro das salas de aula e debater a diversidade com alunos, amigos e familiares. A ação contou com músicas, shows, palestras e recitação de poesias.

Neste ano, o evento chegou a sexta edição e Danielle foi uma das atrações. A jovem fez uma apresentação sobre respeito e diversidade para os colegas de estudo. “Fiquei surpresa. Pensei que de alguma forma fosse vir algo negativo com o show, comigo, mas pelo contrário, foi tudo positivo”, comenta.

Evento contou com a presença da atriz Ana Flávia Cavalcanti (Fabio de Lima/Divulgação)

O projeto foi idealizado em 2013, quando educadores pensaram em ações contra o bullying homofóbico dentro da escola. Principalmente, no tratamento dos alunos entre si com apelidos ofensivos como viado, bicha e sapatão.

“Eventos como esse trabalham a intolerância, respeito, empatia e diversidade. O mundo é diverso, não é o mesmo. O mundo está em constante mutação e é composto pela diversidade”, diz o professor de filosofia Fabio de Lima, 41.

Fabio se diz contente com a colaboração dos alunos, mas lamenta que nem todos os docentes tenham atuado. “Infelizmente alguns professores ainda estão distantes do projeto e preferem não tomar nenhuma posição sobre esse assunto, mas eles respeitam a iniciativa dos alunos”, comenta Fabio.

Os alunos foram responsáveis por boa parte da organização e se dividiram em grupos para elaborar o conteúdo que foi trabalhado durante o evento.

“Ajudo o professor Fábio a organizar tudo. A gente decide toda programação do evento, horário. Ele nos dá autonomia para criar e expressar tudo que queremos transmitir”, responde Danielle.

O evento foi dividido em quatro dias com programações de conscientização por meio da arte sobre o público LGBT.

Os alunos contaram com a presença da atriz Ana Flávia Cavalcanti, que ficou conhecida como diretora Doris, na Malhação Viva a Diferença, de 2017, na Rede Globo.

Houve ainda oficinas de saúde, psicologia e meditação e debates sobre feminicídio e racismo.

“É muito importante um evento como esse. Eu nunca vi uma escola debater o que hoje ainda é um assunto muito polêmico, que é o movimento LGBT, diversidade de gênero, racismo e feminicídio. A sociedade precisa falar sobre isso e entender melhor essas questões”, diz Danielle.

Leticia Marques é correspondente da Brasilândia
leticiamarques@agenciamural.org.br

Queremos conhecer mais nosso leitor. Responda uma pesquisa rápida sobre a Agência Mural

Obra de UBS na Brasilândia tem impasse e moradores temem perder unidade

Parada LGBT de Cidade Tiradentes celebra arte e aborda preconceito

]]>
1
Auxiliar de limpeza ensina a fazer bolos na zona norte de São Paulo https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/12/auxiliar-de-limpeza-ensina-a-fazer-bolos-na-zona-norte-de-sao-paulo/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/12/auxiliar-de-limpeza-ensina-a-fazer-bolos-na-zona-norte-de-sao-paulo/#comments Mon, 12 Nov 2018 20:17:40 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/IMG_20181108_152033-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14857 Aline Kátia Melo

Márcio Ferreira de Lima, 40, é auxiliar de limpeza no CIC (Centro de Integração à Cidadania) Norte há quase quatro anos, no bairro de Jova Rural, na zona norte de São Paulo. Trabalha de segunda a sexta-feira, das 7h às 16h30. Nos últimos dois meses, contudo, a rotina depois do expediente mudou.

Duas vezes por semana, ele ficou mais uma hora e meia para ensinar homens e mulheres a colocar a mão na massa e fazer pães, doces, bolos, salgados.

“Desde os 20 anos trabalho com as duas coisas: limpeza e fazendo bolos, doces e decoração em casa”, conta. Com apoio de moradores e do comércio local, ele montou um curso no próprio trabalho. 

Márcio vende bolos na região onde mora, na Brasilândia, na zona norte de São Paulo. Para propagar o serviço, usa cartões, cartazes e as redes sociais. Por enquanto, porém, a atividade culinária não garante todo o sustento.

Turma faz atividade conduzida por Marcio (Aline Kátia Melo/Agência Mural/Folhapress)

“Gostaria de ter uma sala e continuar a dar aulas para as pessoas. Eu não deixo meu emprego porque esse é o meu sustento, ganha pão. Se falta ingrediente, ou gás, eu tenho como comprar. Meu emprego fixo é meu apoio principal”, confessa.

Márcio mora sozinho nos fundos da casa da mãe e está na área da limpeza há 15 anos. O receio da mudança vem pelo mercado de trabalho. Uma prima que trabalha no setor está há um ano sem emprego. “Tenho medo de perder meu serviço”.

A taxa de desemprego bateu 12,4%, segundo o IBGE, no segundo trimestre. Do total, 56,4% dos desempregados são pardos ou negros.  

DESDE CEDO

O interesse pela cozinha surgiu na adolescência quando ele tinha 12 anos e uma das irmãs mais velhas começou a fazer curso de culinária. “Ela me levava e comecei a gostar”, diz. Com 15, fazia bolo sozinho. Depois, começou a vender. “Lembro do primeiro bolo de cenoura que fiz, que ficou solado, mas eu fui tentando até conseguir”, relembra.

Ele se interessou pela culinária aos 15 anos (Aline Kátia Melo/Agência Mural/Folhapress)

A vontade de compartilhar o que aprendeu com outras pessoas surgiu na mesma época, mas a oportunidade só se concretizou em agosto deste ano. Ele tentou participar de um projeto social da escola de samba Rosas de Ouro e também fez uma proposta para o Programa VAI (Valorização de Iniciativas Culturais) da Prefeitura de São Paulo.

“Depois que não passamos no VAI fiquei triste, mas no outro dia falei com a Denise [Conceição Silva Avarese], diretora do CIC. Mandamos ofício e um hipermercado da região aceitou fazer uma doação de material para três meses”, explica. Os alunos também ajudaram. “Uns traziam farinha. Outra doou uma caixa de ovos fechada, que foi entregue aqui”, diz.

Ao conseguir material, o curso foi divulgado com 40 vagas, em duas turmas sendo 20 nas segundas-feiras e 20 nas sextas-feiras. Ao todo, 30 concluíram as atividades. 

“A gente andou pelas ruas aqui perto levando panfleto. Pensei que ninguém viria, mas vieram senhoras, jovens e casais”, diz. “No primeiro dia, eu fiz, ensinei, mostrei. Depois falei, agora vai ser com vocês. E começaram. Ensinei a fazer broa, rocambole, cupcake”, enumera.

ALUNAS

Por ter sido realizado em dias de semana no período da tarde, o curso atraiu pessoas fora do mercado formal de trabalho como Amaurícia Porto, 51. “Tem pessoas aqui desempregadas, que querem montar um negócio, ou que já vendem. Esse curso vai melhorar a vida de muita gente. A minha mesmo estava parada”, diz a dona de casa.  

Assim como Márcio, a estudante Giovana Gonçalves, 16, aprendeu a preparar bolo com familiares e também vende por encomenda. “Eu amo fazer doces”, diz.

Trabalhar em casa foi uma opção para cuidar do filho de 1 ano e dois meses, que teve meningite. “Quem dá remédio e leva ao hospital sou eu. Parei de estudar, não posso trabalhar nem fazer nada fora, mas faço bolo de pote em casa”.

A formatura da primeira turma foi realizada na última quinta-feira (8), mas Márcio ainda não sabe se vai conseguir continuar. “Vou esperar virar o ano e ver o que faço”, diz. “Vou esperar ver se vai ter novos editais”.

Aline Kátia Melo é correspondente da Jova Rural
alinekatia@agenciamural.org.br

]]>
1
Obra de UBS na Brasilândia tem impasse e moradores temem perder unidade https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/10/01/obra-de-ubs-na-brasilandia-tem-impasse-e-moradores-temem-perder-unidade/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/10/01/obra-de-ubs-na-brasilandia-tem-impasse-e-moradores-temem-perder-unidade/#respond Mon, 01 Oct 2018 21:01:55 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/2-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14522 Ronaldo Lages

Há 38 anos à espera de uma UBS (Unidade Básica de Saúde), a comunidade do Jardim Damasceno, na zona norte de São Paulo, teme perder o projeto.

Após reivindicação, um terreno foi escolhido há seis anos pela prefeitura para que fosse implantada na rua Cristiano Malabia. No entanto, neste ano, a secretaria municipal de saúde informou que o local é impróprio.

A pasta afirma haver falhas na estrutura e que o local é acidentado. A obra não foi iniciada. Agora, a gestão diz que irá procurar outra localização para que seja construída a UBS.

“Estamos aguardando a resposta dos técnicos da prefeitura, chegaram a cogitar um local fora do Jardim Damasceno, mas estamos esperando uma unidade aqui. Nos disseram que o terreno que temos vai gerar muitos custos de verba e que não será possível finalizar a obra”, conta o líder do Movimento Ousadia Popular, Quintino Viana, 73.

O Damasceno abriga mais de 20 mil moradores e faz parte do distrito da Brasilândia. Outro local foi especulado para a obra, mas, embora esteja em melhores condições, faz parte de uma área privada com 242 mil m².

O morador Joaquim Luís Peixoto tem dificuldades para se locomover em busca de medicamentos (Ronaldo Lages/Agência Mural/Folhapress)

Ainda segundo o líder comunitário, existem opções de terrenos vagos no bairro. “Nós queremos ao menos que eles comecem a obra, pois quem esperou 38 anos, pode esperar mais dois. Já saíram verbas e mais verbas e a desculpa é sempre a mesma: que não há terreno. O que mais existe aqui são áreas livres”, relata Viana.

A UBS mais próxima é a Silmarya Rejane Marcolino de Souza, a 3 km, no Jardim Carombé. No entanto, a dona de casa Estrela Aristides de Almeida, 28, reclama do atendimento e das dificuldades para chegar ao local.

“Às vezes, vou a pé porque as lotações demoram demais. O atendimento é ruim porque são poucos médicos para muita gente e marcam consultas a cada dois ou três meses”, diz a moradora.

Um vídeo tem sido compartilhado por moradores denunciando a imensa fila para atendimento na Silmarya. Ela chega a dar volta do lado de fora da UBS.

A dependência do serviço público tem aumentado na região. De acordo com pesquisa da Rede Nossa São Paulo/Ibope, na zona norte 84% utilizaram o serviço público, perdendo apenas para a zona leste com 87%.

Para o aposentado Joaquim Luís Peixoto, 80, a falta da unidade dificulta o acesso aos medicamentos ou atendimentos como inalações, injeções ou curativos.

“Uma UBS aqui ajudaria quem precisa pegar remédios. Mas é difícil um dia ter todos os medicamentos, sempre estão em falta. Chego a ter que ir até a Vila Nova Cachoeirinha para buscá-los”, desabafa.

TERRENO

Em nota, a Coordenadoria Regional de Saúde (CRS) Norte informou que integrantes de movimentos sociais da região indicaram duas opções de terreno para a construção da UBS Jd. Damasceno.

Após análise feita por um engenheiro, constatou-se que apenas um deles, de propriedade privada, oferecia as condições necessárias para a construção da UBS.

A CRS mencionou que entraria em contato com a liderança local, por meio da Supervisão Técnica de Saúde (STS) Freguesia do Ó/Brasilândia, com o objetivo de agendar uma reunião no mês passado, mas ainda não houve uma nova reunião para tratar do tema.

Ronaldo Lages é correspondente da Brasilândia
ronaldolages@agenciamural.org.br

]]>
0
Movimento na Brasilândia cobra retorno de obras do metrô https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/movimento-na-brasilandia-cobra-retorno-de-obras-da-linha-laranja/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/09/10/movimento-na-brasilandia-cobra-retorno-de-obras-da-linha-laranja/#respond Mon, 10 Sep 2018 18:45:01 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/3-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14326 Ronaldo Lages

Com dois anos de paralisação nas obras da linha 6-Laranja, moradores da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, criaram um movimento para cobrar a retomada do projeto: o “Metrô Brasilândia, já!”

O governo do estado começou a anular o contrato com a empresa responsável em março e deve abrir uma nova licitação. A linha ligará a região com mais de 264 mil habitantes à estação São Joaquim, no centro da capital.

Aluno de pedagogia e estagiário da área de educação, Fernando Ferreira dos Santos, 35, é um dos organizadores do comitê. “O movimento tem oito meses. Fizemos algumas reuniões, mas apenas agora começou a ganhar força”, afirma.

A ideia é levar a cobrança para a Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo). Orçada em R$ 9,6 bilhões, a obra começou em 2013 e teve apenas 15% da execução concluída. Deveria ser entregue em 2020. Recentemente, a previsão foi postergada para 2021.

Enquanto o processo não avança, mudanças já ocorreram como as desapropriações de imóveis. Porém, os espaços ficaram vazios e têm causado reclamações de falta de segurança. Mais de 50 pessoas participaram de um ato do grupo no domingo (2) no salão da Igreja Santo Antônio de Vila Brasilândia.

Fernando Ferreira dos Santos, um dos organizadores do comitê (Ronaldo Lages/Agência Mural/Folhapress)

“Desapropriaram os moradores e acabaram com o bairro, parece um cemitério grande e fechado por tapumes”, diz Suzimar de Moraes, 50, morador do bairro.

Para o auxiliar de manutenção predial, Ricardo da Silva Muniz, 34, o maior desejo de se ter uma linha de metrô é para desafogar o trânsito do distrito, além da superlotação dos ônibus.

“Ajudaria muito no deslocamento. Sofro todos os dias, as lotações e os ônibus não dão conta por aqui”, reflete Muniz.

A professora Ana Paula Pascarelli dos Santos é diretora da Escola Estadual João Solimeo, situada em frente ao terreno desapropriado para a estação. A obra finalizada poderia ajudar especificamente os estudantes do ensino médio que já atuam no mercado de trabalho.

“O período noturno tem mais de 700 alunos. Muitos são trabalhadores e têm dificuldade de chegar aqui. O fato de terem que pegar duas ou três conduções todos os dias impacta muito no aprendizado”, analisa a professora.

Casa desapropriada em 2016, hoje espaço está abandonado (Ronaldo Lages/Agência Mural/Folhapress)

RETORNO DAS OBRAS?

A STM (Secretaria dos Transportes Metropolitanos) informou que está em andamento o processo de caducidade do contrato de concessão da Linha 6 – Laranja. A expectativa é que o processo termine este ano e seja aberta uma nova licitação.A previsão é que o contrato seja retomado no início de 2019.

A medida ocorreu após o descumprimento da última notificação, em fevereiro deste ano, enviada à concessionária Move São Paulo que determinava a retomada das obras em 30 dias.

A Move São Paulo alega dificuldades na obtenção de financiamento junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), especialmente após o envolvimento das empreiteiras brasileiras na Operação Lava Jato.

Segundo a STM, a empreiteira foi notificada em 13 autos de infração para que retornasse às obras.

Ronaldo Lages é correspondente da Brasilândia
ronaldolages@agenciamural.org.br

VEJA TAMBÉM:

Irmãos capoeiristas da Brasilândia mantêm legado do pai e são campeões

Laje na Brasilândia vira espaço de teatro em São Paulo

Dos morros da Brasilândia ao interior, músico pedala 3,5 mil quilômetros em 2018

]]>
0
Irmãos capoeiristas da Brasilândia mantêm legado do pai e são campeões https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/08/14/irmaos-capoeiristas-da-brasilandia-mantem-legado-do-pai-e-sao-campeoes/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/08/14/irmaos-capoeiristas-da-brasilandia-mantem-legado-do-pai-e-sao-campeoes/#respond Tue, 14 Aug 2018 15:57:33 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/WhatsApp-Image-2018-08-14-at-13.04.28-1-1-320x213.jpeg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14080 Cleber Arruda

No Dia dos Pais, comemorado no último domingo (12), fotos carinhosas e mensagens melosas pipocaram nas redes sociais; a saudade daqueles que não estão por perto ou mais presentes marejam os olhos com recordações.

Nesta ocasião, o contramestre de capoeira Sidney dos Santos Dias da Cruz, 29, prestou uma homenagem ao pai gingando e contrariando qualquer sentimento de ausência. Conhecido como Sidney Fiu, o capoeirista é filho do mestre Natal, falecido em 2002.  

“Não dá para sentir saudade do meu pai, porque ele está presente em cada roda de capoeira, cada toque de berimbau. E comemorei este dia jogando capoeira com ele”, diz o capoeirista da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, após ter participado de uma roda na Praça da República, no centro da capital.

Mestre Natal, Natalino Dias da Cruz, fundou uma academia de capoeira na Brasilândia, na década de 1980. Segundo os filhos, todos capoeiristas e nascidos na região, a escola durou cerca de 25 anos e se tornou o grupo Fiu (Família Irmãos Unidos).

A academia fechou após a morte do mestre. Em meados de 2006, Sidney Fiu e os outros dois irmãos retomaram o projeto e deram continuidade ao trabalho da Fiu. Desde lá, venceram competições nacionais e mundiais do esporte.

“Nascemos na capoeira e fomos até hoje. Mesmo quando a academia fechou, continuamos a treinar em casa. Até conseguirmos um espaço para darmos aula”, conta Arthur Santos Dias Cruz, 26, o Arthur Fiu, caçula da turma.

Ele faz questão de lembrar um momento especial com o pai. “Fui o último a pegar a corda de professor com o mestre Natal, foi uma honra muito grande. Consegui me formar com ele, como professor mirim na época”.

Com luta e disciplina, o jogo virou. Em julho, Arthur Fiu foi vencedor do Campeonato Mundial da Federação de Capoeira em Baku, no Azerbaijão. Além de outros títulos, ele recebe o patrocínio de uma marca e é um dos nomes mais cotados em campeonatos nacionais e internacionais. No domingo, estava em um evento na Argentina.

Mestre Natal, pai dos capoeiristas e fundador do grupo Fiu (Família Irmãos Unidos) (Arquivo pessoal)

A primogênita da turma é Natália dos Santos Dias da Cruz, 31, Natália Fiu. Contramestra em capoeira, ela também luta jiu-jitsu e está à frente do projeto Pisada do Tambor, que trabalha com samba de caboclo e também com workshops voltados para mulheres.

Um dos seus principais desafios é o combate ao preconceito com mulheres nas lutas. “Tive poucos momentos com meu pai, pois ele não exigia muito de mim, como dos meus irmãos. Até porque tem um certo machismo, de que não é coisa para mulher, mas eu treinava e era bem livre para fazer”.

Natália não abandonou a capoeira e faz uma avaliação do papel feminino no jogo. “Tenho crítica às mulheres, elas querem espaço, mas acho que é necessário que façam tão bem quantos os homens, que estudem e se dediquem, porque elas não são incentivadas como eles”.

O trio desenvolve atividades da Fiu para uma média de 300 alunos em cinco polos diferentes da cidade, entre eles, a Casa de Cultura da Brasilândia, onde os irmãos dão aulas gratuitas durante dois dias na semana. Além de espalharem alunos que integram o grupo Fiu em países como a França, Chile e Colômbia.

Títulos dos Fiu:
Natália Fiu – contramestra de 1º grau na capoeira
Tem trabalho de formação rítmica livre para novatos na capoeira e exerce trabalhos culturais de formação e apresentação com samba e capoeira
Campeã mundial em Londrina do Grupo Maculelê (2017)
Campeã internacional da Copa Herança (2017)
Campeã do Campeonato SP Open (2016)
Campeã brasileira NOGI (2016)

Sidney Fiu – contramestre de 2º grau
É o responsável pelos treinos técnicos do irmão Arthur Fiu para competições. Desenvolve trabalho social no CTN (Centro de Tradições Nordestinas) com oficinas de capoeira e fabricação de instrumentos
Campeão da Copa Herança (2017).

Arthur Fiu – contramestre de 1º grau
É patrocinado por uma marca e desenvolve trabalho social na Casa de Cultura da Brasilândia, com aulas de capoeira e culturas populares
Campeão mundial da Federação de Capoeira (2018)
Campeã mundial em Londrina do Grupo Maculelê (2017)
Vice-campeão do campeonato RedBull Paranauê (2017)

Cleber Arruda é correspondente do Jardim Damasceno
cleberarruda@agenciamural.org.br

]]>
0
Laje na Brasilândia vira espaço de teatro em São Paulo https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/07/11/laje-na-brasilandia-vira-espaco-de-teatro-em-sao-paulo/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/07/11/laje-na-brasilandia-vira-espaco-de-teatro-em-sao-paulo/#respond Wed, 11 Jul 2018 12:03:36 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/1-320x213.jpg http://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=13690 Ronaldo Lages

A ausência de alternativas culturais dedicadas à juventude das periferias incomodava a arte-educadora e dona de casa Tatiane Góis, 29.

Foi quando ela decidiu usar o espaço da laje de sua própria casa na Brasilândia, na zona norte de São Paulo, para ensaiar e encenar peças teatrais montadas pela companhia que criou.

Batizada de Cia Teatro de Laje, o grupo nasceu em julho de 2017 dedicado aos jovens da região que desejavam aprender dramaturgia e que ensaiam no local aos domingos.

“As crianças sentam no chão e a gente monta [o cenário] com tecido improvisado. As telhas são de ferro e acabam por esquentar muito, é uma estrutura precária, mas é isso que deixa a laje atraente”, conta Tatiane.

Alunos arrumam espaço antes de fazer as peças (Divulgação)

“É um espaço colaborativo, alguns jovens ajudam a pintar e a varrer, por isso estamos buscando um apoio por meio de edital para comprar cadeiras e mesas para que nossas atividades tenham mais conforto”, ressalta a idealizadora do projeto.

Tatiane aproveita o espaço para promover debates e rodas de conversa sobre violência policial, genocídio da juventude negra nas periferias e encarceramento em massa dos jovens. Contudo, ela diz não trazer esses temas às peças na tentativa de quebrar imagens preconceituosas sobre quem mora na favela.

“As pessoas esperam ver uma peça com um traficante falando gírias, quando na realidade as meninas descem as vielas vestidas de fadas com os meninos de marinheiro cantando e tocando violão. Isso provoca, é uma quebra de estereótipos”, desabafa Tatiane.

A empregada doméstica Giovana Silva Rocha, 18, é voluntária na companhia e nunca havia frequentado um teatro antes.

Espaço começou a funcionar no ano passado (Divulgação)

“Me falaram sobre a ideia de montar um projeto para ensinar algo para jovens da quebrada e eu não acreditei que daria certo. Aos poucos a Tati foi divulgando no boca a boca, colando cartazes nos postes e chamando a comunidade, e vingou. As crianças descobriram uma forma gostosa de aprender”, declara.

“Às vezes até esqueço que estamos numa laje. É uma experiência diferente, eu consigo ver além daquilo, a mente trabalha junto”, relata a espectadora encantada.

Para Gustavo Henrique Amorim, 15, que desde o início do ano participa das atividades do grupo, o poder da arte sobre a população.

“Aqui no bairro existem muitos jovens como eu que têm interesse em teatro e não encontram oportunidade”, afirma Gustavo.

“A companhia contribui para libertar o nosso desejo e faz com que a comunidade possa entender que é possível fazer cultura aqui”, ressalta.

CINEMA

Não é apenas o teatro que tem espaço na laje de Tatiane. Há também um cinema improvisado uma vez por semana com a exibição de documentários como “Ilha das Flores” (1989) e filmes como “Cidade de Deus” (2002).

“Percebemos que muitos jovens estavam empolgados com as oficinas de teatro e decidimos fazer exibições de cinema, mas não tínhamos material. Sabendo disso, um amigo nos fez uma doação e pudemos realizar mais essa ideia”, conclui Tatiane.

Ronaldo Lages é correspondente da Brasilândia
ronaldolages@agenciamural.org.br

]]>
0
CEU na Brasilândia tem piscina fechada e moradores cobram nova via de acesso https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/06/20/ceu-na-brasilandia-tem-piscina-fechada-e-moradores-cobram-nova-via-de-acesso/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/06/20/ceu-na-brasilandia-tem-piscina-fechada-e-moradores-cobram-nova-via-de-acesso/#respond Wed, 20 Jun 2018 13:20:37 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Foto-1-320x213.jpg http://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=13613 Gabriel Sousa

Construído no topo de um morro do Jardim Paraná, o CEU Paz completou 14 anos em maio no distrito da Brasilandia, na zona norte de São Paulo.

Apesar de ser considerado um espaço de educação, cultura e lazer pelas famílias da região, o local enfrenta problemas de infraestrutura: as piscinas estão fechadas desde 2016 e uma via para facilitar o acesso ainda não foi construída.

“Meu filho vinha bastante tomar banho na piscina, mas faz tempo que já está assim fechada”, diz a auxiliar de limpeza Luana Cláudia dos Santos, 30.

De acordo com a secretaria municipal da Educação, as piscinas recebiam até 600 pessoas por dia e a reforma está em fase de licitação.

Sem a opção de banho, Luana e os filhos aproveitam as festas que ocorrem no CEU Paz. “Gosto da festa junina, Dia das Crianças, da primavera, acho todas bem legais”, conta.

As piscinas foram fechadas em 2016 para manutenção. (Gabriel Sousa / Agência Mural/Folhapress)

Ex-estudante do CEU Paz, o publicitário Carlos Vítor, 26, oferece no local aulas voluntárias de comunicação e criação de conteúdo. Ensina desde a criar um e-mail até a produzir e editar vídeos.

Carlos era presidente do Conselho Gestor do CEU Paz em agosto de 2017, quando participou de uma reunião com representantes da Dersa (Desenvolvimento Rodoviário SA), da prefeitura regional da Freguesia do Ó/Brasilândia, da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) para solicitar a construção de uma nova via no local.

O argumento é que ela pode facilitar a chegada do público à escola, localizada em um local de difícil acesso. A via ligaria as ruas Dalva Barbosa Vilas Verdes e Catanduvas. Os moradores acreditam que a construção deve ser uma forma de compensação pela obra do trecho norte do Rodoanel.

“Foi um pedido dos moradores e também comentado nas reuniões de gestores, por uma compensação estrutural pela obra do Rodoanel. Até agora só fizeram na região ações sociais, como casamentos comunitários, alguns eventos para o ingresso de jovens no mercado de trabalho, palestras e oficinas”, conta Carlos.

“A via facilitaria, por exemplo, a vinda de eventos para o CEU. Já tivemos peças de teatro que não vieram para cá por não ter uma via acessível para o caminhão trazer algum tipo de estrutura”, completa.

A Dersa, empresa responsável pelo Rodoanel e a prefeitura regional da Freguesia do Ó/Brasilândia foram contatadas, mas não responderam à Agência Mural até a publicação desta matéria.

O edifício do EMEI e EMEF à esquerda, CEI à direita e o Centro Cultural na parte de trás. (Gabriel Sousa / Agência Mural/Folhapress)

Segundo a gestão do CEU Paz, a unidade iniciou 2018 com 2.124 alunos matriculados na creche, ensino infantil e ensino fundamental. Além do ensino regular, a população tem acesso a atividades esportivas, culturais e educacionais – como capoeira, futebol, balé e música.

“Eu estou aqui no Jardim Paraná desde 1994. Vi a construção do CEU”, lembra a dona de casa Cleide Vieira, 50, que diz ter acompanhando as transformações que a escola trouxe para a comunidade.

Hoje, ela pratica exercícios físicos e participa de aulas de artesanato. Já a neta, Yasmin, 11, estuda o sexto ano na escola e faz aulas de violão. “O ensino daqui é ótimo. A construção do CEU foi a melhor coisa que já aconteceu aqui, é bom para muitos moradores”, avalia Cleide.

O espaço também possui uma das salas do Circuito de Cinema Spcine, rede de salas públicas de cinema que oferece ingressos gratuitos . A média de público entre janeiro e junho deste ano foi de 2 mil espectadores ao mês. É o sexto maior público da rede, de acordo com a Spcine.

Já em relação a biblioteca, em média 235 livros são emprestados por mês. Em maio, foram realizadas em torno de 1.200 consultas ao acervo.

Gabriel Sousa é correspondente do jardim Elisa Maria
gabrielsouza. mural@gmail.com

]]>
0
Grande SP e capital têm buzinaços de motoristas de Uber e redução de ônibus https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/05/25/grande-sp-e-capital-tem-buzinacos-de-motoristas-de-uber-e-reducao-de-onibus/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/05/25/grande-sp-e-capital-tem-buzinacos-de-motoristas-de-uber-e-reducao-de-onibus/#respond Fri, 25 May 2018 20:17:38 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/WhatsApp-Image-2018-05-25-at-8.39.31-AM-320x213.jpeg http://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=13389 No quinto dia de paralisações dos caminhoneiros pelo Brasil, os bairros das periferias de São Paulo e as cidades da região metropolitana viveram uma maior escasses com relação ao transporte, paralisação de outros setores em solidariedade à categoria e a alta nos preços.

Pelas ruas de Osasco e de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, houve buzinaços de grupos que apoiam os manifestantes. No caso osasquense, até motoristas de Uber estiveram nas vias da região central. Prefeituras tomaram medidas para manter o estoque de combustível.

Por outro lado, moradores sentiram a alta no preço dos alimentos em feiras livres no Capão Redondo, na zona sul. No Grajaú, a situação do transporte também foi afetada nas primeiras horas do dia e ainda deve complicar a volta para casa. Com a falta de combustível, algumas vias ficaram vazias com jeito de feriado. Na quinta-feira, a situação já havia começado a se agravar nos bairros. 

Além disso, correntes no WhatsApp têm sido espalhadas com mensagens que pedem apoio aos bloqueios de rodovias, após o anúncio do presidente Michel Temer (MDB) de que o Exército será utilizado para desbloquear as vias.

Centro de Osasco teve protestos (Paulo Talarico/Agência Mural/Folhapress)

Buzinaços de Uber e vans marcam sexta-feira em Osasco

Dois protestos marcaram a sexta-feira (25) em Osasco. Vans escolares fizeram uma carreata por algumas vias da cidade, em apoio ao protesto dos caminhoneiros. Além disso dezenas de condutores com os vidros pintados “Uber Greve” passaram por ruas do centro da cidade.

“Assim como todos os brasileiros, a Uber acompanha com atenção as notícias sobre a crise de abastecimento no país”, afirmou a empresa em nota. “A empresa entende que, como autônomos, os motoristas parceiros têm o direito de se manifestar, dentro do que a lei permite. Neste momento, reforçamos nossos canais de atendimento para estar em contato permanente com os parceiros e usuários e prestar o suporte que for possível”, ressaltou.

Apesar das paralisações, a prefeitura de Osasco informou que ainda não foram afetados serviços municipais essenciais e não houve a necessidade de baixar decretos de emergência.

“Sobre o transporte público, as empresas que atuam na cidade adotaram um intervalo maior entre os ônibus, semelhante ao que realiza aos sábados. No domingo, a frota terá uma redução de 20%”, informou a gestão.

Cidades vizinhas como Barueri, Itapevi e Jandira anunciaram a redução no número de ônibus nas ruas. Neste sábado (26), a frota circulará com o horário de domingo, com menos veículos. Ainda em Itapevi, a prefeitura determinou que o diesel só poderá ser vendido para ambulâncias. [PAULO TALARICO]

No ABC, coleta foi suspensa e transporte de pacientes interrompido em São Caetano

Em São Caetano do Sul, no ABC paulista, foram suspensas neste fim de semana o transporte de moradores para serviços de saúde. Os demais serviços funcionam normalmente. Na vizinha São Bernardo do Campo, apenas a coleta de lixo foi interrompida. Moradores relataram falta de combustível e evitaram fazer o trajeto para São Paulo.

“Não há combustível num raio de 10km”, afirmou o estudante Wellington Alves da Silva, 37. Morador do jardim Irajá, ele comentou que a rodovia Anchieta estava com problemas para o acesso, por conta da manifestação de condutores de vans escolares.

No caso de Diadema, o número de ônibus foi reduzido e a prefeitura pediu para os moradores “utilizarem com consciência” o transporte coletivo. “As escolas, os equipamentos de saúde e demais serviços poderão ser afetados em virtude da dificuldade de deslocamento dos funcionários”.

Em Santo André, a relações públicas, Thais Brandão, 25, teve dificuldades ao tentar voltar para casa em São Mateus, zona leste da capital na quinta-feira (24). Depois de fazer vários pedidos de carro, via aplicativo, um motorista aceitou a viagem, com previsão de chegada em 7 minutos. Como o veículo não se movimentou, ela questionou a demora. “Estou na fila do posto abastecendo”.

Mesmo sendo afetada, com menos opções para sair de casa, Thais apoia o movimento dos caminhoneiros. “Não ganho diretamente com isso, mas a meu ver, a paralisação é importante  para que uma classe de trabalhadores, extremamente desvalorizados, possam conseguir mudar alguma coisa”, reforça. (KÁTIA FLORA, LUCAS VELOSO E PAULO TALARICO)

Mogi também reduz frota de ônibus

Em Mogi das Cruzes, na zona leste da Grande São Paulo, teve protestos na quinta-feira (24) de caminhoneiros e motoqueiros que fizeram um buzinaços pelas ruas do centro da cidade.

A prefeitura anunciou um plano emergencial com a redução de 37 ônibus em 28 linhas municipais, o que ampliou os intervalos. A decisão foi tomada em conjunto pela Prefeitura e concessionárias.

A empresa CS Brasil operará com 22 ônibus a menos, em 18 linhas. Já a Princesa reduzirá a frota em 15 veículos, em 10 linhas.

“A companhia abasteceu os veículos em postos e dispõe de combustível para que seus ônibus que operam na região do Alto Tietê sigam atendendo à população, sem qualquer prejuízo de qualidade ou de oferta, até este domingo (27)”, afirmou a empresa em nota. [JÉSSICA SILVA]

Zona leste: Estudante demora 50 minutos em estação em Guaianases

Nesta quinta-feira (24), o estudante Higor Antunes, 21, estava em São Miguel Paulista, zona leste, por volta das 16h. Quando estava voltando para casa, que fica em Guaianases, esperou por mais de 50 minutos um ônibus.

Além da demora, o coletivo estava cheio. “É um ônibus que não costuma lotar e nem demorar tanto para chegar onde eu queria”, afirmou. “Além disso, toda vez que passava por um posto de gasolina, era um tumulto, pois os carros estavam enfileirados atrapalhando o caminho”, relembrou.

Nesta sexta-feira (25), Higor resolveu sair mais cedo de casa para não sofrer com os atrasos. Por fim, demorou 1h50, de Guaianases até o bairro do Cambuci, caminho que geralmente ele faz em 1h, com um trem e dois ônibus. [LUCAS VELOSO]

Feira vazia na manhã desta sexta-feira, no Capão Redondo (Dalton Assis/Agência Mural/Folhapress)

Zona sul: No Capão, alface foi vendido 2 vezes mais caro

A feira livre do jardim Maracá, no Capão Redondo,  estava vazia por volta das 11h, horário de grande movimento no bairro da zona sul de São Paulo.

Havia poucas barracas de hortifruti. As que foram montadas cobravam até R$4.50 em um pé de alface crespa. Um dia antes, o mesmo foi vendido por R$ 1,50 no supermercado. A batata sumiu das bancas. Gritos e frases com rimas para atrair os clientes, hoje deram lugar a reclamação pelo baixo número de vendas.

Os sacolões do bairro também aumentaram os preços do seus produtos, o quilo do pimentão vermelho saiu por R$13,90 e a bandeja de ovos com 30 unidades é vendida por até R$14,50. “Cada mercado está praticando um preço diferente com essa greve, o jeito é você fazer as compras de forma picada, até encontrar um preço adequado”, diz a dona de casa Cristina Santos Reis, 57.

Nas redondezas do centro do Capão Redondo até a estação de metrô da linha 5-Lilás, poucos  carros nas ruas e o fluxo de ônibus diminuiu em comparação com ontem. Pelo bairro, também houve paralisação das vans escolares. Motoristas estacionaram na lanchonete da avenida Elias Maas.

Zona sul: Ônibus interrompe viagem sem combustível no Grajaú

Quando saiu de casa, a auxiliar de serviços gerais Adeilde Azevedo dos Santos, pegou o ônibus Grajaú-Pinheiros por volta das 5h da manhã. A ideia era fazer o percurso entre o bairro da zona sul e a região de Santo Amaro, mas a viagem foi interrompida na estação de trem do Grajaú.

O motorista disse que o combustível tinha acabado. Ela teve de mudar de ônibus e foi de Vila Mariana, para tentar chegar ao trabalho.

A cena foi uma das que os passageiros viveram na manhã desta sexta-feira (25). Boa parte dos ônibus que vinham do Cocaia, um dos bairros mais distantes do distrito, não estavam parando pela manhã, por conta da lotação.

Apesar de todo o caos, havia quem não sabia o que estava acontecendo. Uma passageira não tinha a mínima ideia e ao passar pela Ponte do Socorro, ainda na zona sul, ela estranhou ao ver caminhões parados.

“É a greve. Os caminhoneiros estão em greve, por isso tá essa confusão. É que vc não assiste televisão, né? Mas vc não viu o negócio do leite que te enviei [pelo whatsapp]?Tiveram que jogar fora”, disse uma amiga. [PRISCILA PACHECO]

Zona norte: Motorista de caminhão de lixo na Brasilândia apoia protesto

Motorista da coleta de lixo de São Paulo há sete anos, Gerson Peres, 40, mora da Brasilândia, zona norte da capital. Nesta quinta-feira (25), ele teve de ir a um bairro mais distante em busca de produtos e ouviu do vendedor que não havia mais gás.

No entanto, ele enfatizou ser a favor dos protestos. “Acho que todos que dependem de combustível se sente sendo sugado pelo sistema, pelo preço do combustível”, diz o motorista. “Se o caminhão que eu trabalho fosse meu, com certeza estaria junto com os companheiros na manifestação que eu considero justa”, completa Gerson.

O serviço de lixo na capital começou a ter interrupções e a prefeitura declarou emergência. “A partir do momento que nós [da coleta de lixo] não sairmos na rua, toda população será prejudicada, pelo acúmulo de resíduos”, comenta Gerson. (LETICIA MARQUES)

 

]]>
0