Vizinhos de presídio em Santana ficam sem sinal de celular e culpam bloqueador
Sidney Pereira
A penitenciária feminina de Santana, complexo que ocupa uma área de 108 mil m², na zona norte de São Paulo, tem dado dor de cabeça a moradores, empresas e trabalhadores da região.
Para evitar o uso irregular de telefone celular pelas 2.000 detentas do presídio, o prédio conta com equipamentos bloqueadores de sinal. Mas, desde outubro do ano passado, os vizinhos relatam frequentes interferências nos aparelhos ou até ausência completa de sinal.
A situação mais crítica é a da agência do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) na avenida Ataliba Leonel, localizada em frente aos pavilhões da penitenciária. A maioria do público atendido ali [cerca de 10 mil pessoas por mês] é formada por idosos, gestantes ou pessoas que irão passar por perícia médica.
Com alguma frequência ocorrem situações em que alguém passa mal e é necessário chamar o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência). A gerente da agência, Maria Inês Santos, 57, explica que o contato, via celular, fica impossível e só resta usar o telefone fixo.
“Preciso deslocar três funcionários quando acontecem casos de emergência. Enquanto um liga para o SAMU e ouve as orientações, outro conversa com o segurado para colher os dados pessoais e poder descrever a condição física. Um terceiro fica levando as informações de um lado para o outro”, relata.
Como a agência recebe pessoas com mobilidade reduzida, é inevitável a dificuldade na volta para casa. Com o celular sem sinal, não dá para chamar transporte por aplicativo e a única opção é pedir ajuda à família pelo telefone fixo da agência.
“Aqui passam poucos táxis e as pessoas ligam para algum parente vir buscar ou então chamar um carro de aplicativo. É bem desconfortável”, lamenta a gerente.
O panfleteiro Moacyr dos Santos, 56, morador do Ipiranga, viveu uma situação dramática nessa região há menos de um mês. “Estava trabalhando, quando comecei a passar mal, suar frio, não sentia as pernas e braços e desmaiei na calçada bem perto dessa agência do INSS”.
Ele foi socorrido por pessoas próximas, que tentaram chamar uma ambulância, mas ninguém conseguiu usar o celular. “Quem me ajudou disse que só depois de 20 minutos passou um táxi e fui levado direto para o pronto socorro de Santana. Quando acordei, o médico disse que tive um infarto e muita sorte. Mais uns minutos sem socorro e eu teria morrido”, conta.
Na rua Gabriel Piza fica o Condomínio Rio Tocantins, um prédio residencial com 144 apartamentos. Ali, todo o bloco que faz frente para o presídio sofre interferência do bloqueador de sinais.
Apesar de morar no 17º andar, a aposentada Maria Donega, 75, reclama das constantes falhas. “Eu trabalho com decoração e recebo encomendas de cortinas e outras peças pelo celular. Sempre demora muito para abrir as mensagens e os arquivos. Tenho prejuízos diários”, revela.
A situação fica pior porque a aposentada diz ter cancelado o plano do telefone fixo. “As contas estavam altas e eu usava muito pouco”, diz.
PRESÍDIO NO MEIO DA CIDADE
A penitenciária feminina, inaugurada em 2005, fica ao lado do Parque da Juventude e da estação Carandiru do metrô. A SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) confirma o uso do equipamento de bloqueio em Santana e em outras 28 unidades prisionais no estado de São Paulo. Ela não cita quando o aparelho foi implantado.
“Os bloqueadores de sinais móveis têm como objetivo evitar que sejam usados os meios de telecomunicações de forma ilegal em ambientes controlados”. O órgão alega realizar “ajustes diários sempre que é detectada qualquer alteração por parte das operadoras”.
A SAP justifica que a empresa contratada pelo serviço “mantém contato contínuo com as operadoras para evitar a ocorrência de interferências prejudiciais fora dos limites do estabelecimento penitenciário. A resolução Anatel nº 308, de 11 de setembro de 2002, respalda o uso da tecnologia”, afirma.
A reportagem também questionou a secretaria sobre qual o raio de alcance dos bloqueadores, o que está sendo feito para minimizar os transtornos causados pelos equipamentos e se a população foi orientada sobre a questão, mas não houve resposta.
Sidney Pereira é correspondente da Vila Maria
sidneypereira@agenciamural.org.br
Apoie o jornalismo da Mural e ajude a desconstruir os estereótipos sobre as nossas quebradas. Saiba como
VEJA TAMBÉM:
Órfãos da Portuguesa, moradores da zona norte se unem para reerguer clube
Crise leva artista africano a vender obras nas ruas de São Paulo