Atriz, diretora e parteira, Ciléia Biaggioli defende mais cultura em Parelheiros

Luana Nunes

Moradora da região de Parelheiros desde 2010, Ciléia Biaggioli, 41, tem se dividido entre dar aulas de teatro, se apresentar e ensinar o processo de parto humanizado para mulheres que vivem no distrito do extremo sul de São Paulo. 

Atriz, diretora e parteira, ela faz questão de falar da importância da cultura e da arte para a região. “Vejo a arte como uma ferramenta de transformação social. Eu nasci na periferia e consegui fazer teatro gratuitamente”, conta a atriz. 

Ela cresceu na cidade de Taboão da Serra, na Grande São Paulo, antes de chegar em Parelheiros. 

Fundadora do Teatro Rocokós em 1998, a atriz iniciou a carreira aos 15 anos, quando participou de um curso de teatro no Butantã, na zona oeste da capital. Atualmente, Ciléia faz atuações junto às escolas.

Em casa, a atriz oferece aulas de circo, música, retiro para palhaços e formação de doulas (mulheres que dão suporte físico e emocional a outras mulheres antes, durante e após o parto). Ciléia compartilha com indígenas das aldeias da região a se tornarem parteiras. 

Rosi Reis, fundadora do grupo Tambores de Saia, participou da Semana de Arte em Parelheiros (Luana Nunes/Agência Mural/Folhapress)

Ciléia conta que a ligação com o parto humanizado veio quando engravidou da primeira filha e tinha receio de hospitais. “Eu já sabia como tinha que ser e no hospital não podia fazer nada como por exemplo escutar música e estar totalmente nua”, explica a parteira. 

Depois de visitar o hospital no qual daria luz, ficou incomodada, porém não conhecia nenhum outro lugar que atendesse o que ela procurava. Com a ajuda de uma amiga conseguiu ter o parto da forma que queria. 

Essa ligação com os partos do bairro não a afastou dos palcos. A diretora divide mensalmente as aulas que dá em casa, os projetos e o auxílio às mães. 

ROCOKÓS

O Teatro de Rocokós é composto pela diretora e mais nove pessoas, dos quais quatro são filhos dela e também conta com a ajuda do marido. Não há função fixa, todos apoiam no que precisar. 

Na última semana, o grupo promoveu a terceira Mostra de Artes e Teatro de Rua de Parelheiros. Foi a terceira edição do evento, realizado pela primeira vez em 2017. 

Grafiteiras de Parelheiros. Grupo queria fazer intervenção na Casa de Cultura, mas prefeitura vetou ação (Luana Nunes/Agência Mural/Folhapress)

O evento não recebeu qualquer subsídio e foi realizado com o apoio dos próprios artistas e de moradores locais. “Ninguém anda sozinho, nós não precisamos de arma, precisamos de poesia”, diz Ciléia. “A gente está aqui para fortalecer os novos grupos e continuar na luta com os que já fazem parte dessa união”, conclui.

Neste ano, a intervenção cultural homenageou a escritora Tula Pilar (que morreu em abril deste ano). A mostra colocou em em cena questões sobre a vivência feminina.

Foram 17 intervenções artísticas na praça Julio César de Campos, como a exibição do documentário sobre a mãe solo, produzido em 2017, retratando o protagonismo de oito mães das periferias de São Paulo que não tiveram a figura de um pai na criação dos filhos. 

“O que não me fez desistir foram os resultados, a colheita de ver tantos alunos que hoje em dia vivem de teatro e levam esse legado para outros como nós”, diz Ciléia

Para educadora cultural, Rosi Reis, 39, fundadora do grupo “Tambores de Saia”, que participa desde a primeira mostra, é preciso falar mais dos movimentos de fomento à arte e a cultura nos extremos. “Disseminar a arte e a cultura é a mola propulsora do exercício da cidadania, pois amplia a visão de mundo e também as possibilidades”.

O grupo com cinco integrantes canta, dança e declama sobre temas sociais. No fim de semana estreou a performance “Somos Um”, que aborda preconceitos como machismo, a homofobia, gordofobia e racismo, situações vividas por integrantes do grupo.

“A junção desses grupos é a união de todas as forças, causas e lutas. Somos cinco e cada um tem uma causa para lutar, então abraçamos todas essas causas juntos”, conclui a artista.

CASA DE CULTURA E VETO AO GRAFITE

Após dez anos de espera, o bairro agora conta com a Casa de Cultura de Parelheiros, inaugurada em maio deste ano. A abertura oficial teve a participação de artistas locais junto ao Fórum de Cultura de Parelheiros.  

Segundo Ciléia, ela entrou com um pedido na subprefeitura da região para autorização para que ela, em parceria com as grafiteiras que fazem parte do movimento artístico do bairro, pudessem pintar o escadão que dá acesso à Casa de Cultura, mas esse pedido foi negado. 

“Só queremos a autorização, vamos dar as tintas e todo o material. Vamos deixar o lugar mais atraente, com mais arte”, conta a diretora.

Em contato com a subprefeitura de Parelheiros, a assessoria respondeu que é proibida a pintura ou fazer grafite no local, por se tratar de um patrimônio público. E que a subprefeitura não autoriza grafites em calçadas utilizadas por pedestres, pois a manutenção das mesmas deve ser feita pelo proprietário. 

Luana Nunes é correspondente de Parelheiros
luananunes@agenciamural.org.br

Mães indígenas se tornam líderes de aldeias no extremo sul de São Paulo

Quatro anos após incêndio, escola em Parelheiros segue sem reforma

Moradores de Barragem caminham 40 minutos para chegar no primeiro ponto de ônibus