Mural https://mural.blogfolha.uol.com.br Os bastidores do jornalismo nas periferias de SP Mon, 27 Dec 2021 13:12:41 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Perto do vestibular, estudantes de Perus conhecem escritor angolano Pepetela https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/11/05/perto-do-vestibular-estudantes-de-perus-conhecem-escritor-angolano-pepetela/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/11/05/perto-do-vestibular-estudantes-de-perus-conhecem-escritor-angolano-pepetela/#respond Tue, 05 Nov 2019 17:11:35 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/11/2019-10-18_PEPETELA-EM-PERUS_0014-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=16957 Jéssica Moreira

Foi durante uma aula de redação que o angolano Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos abandonou a mesmice dos temas gerais e escreveu a primeira história.  “Pensei que a professora iria brigar, mas ela gostou muito e leu para a turma. Me livrei das redações sem graça nenhuma”, conta. 

Descobrira ali a vocação para escritor, tornando-se mais tarde Pepetela. Aos quase 78 anos, o autor é um dos maiores nomes da Literatura de Língua Portuguesa no mundo, vencedor do Prêmio Camões. A obra Mayombe é leitura obrigatória do vestibular da Fuvest, vestibular que dá vagas para a USP (Universidade de São Paulo). 

Às vésperas dos vestibulares no país, o escritor africano esteve na Biblioteca Padre José de Anchieta, em Perus, na região noroeste de São Paulo, no mês passado, reunindo mais de 200 pessoas em uma sexta-feira à noite, principalmente estudantes de escolas públicas e de cursinhos populares da região.

“Ele vai cair no vestibular e a gente está o vendo aqui, ao vivo. Aproxima a gente. Quando eu ver o nome dele na prova, vou lembrar desse momento”, diz Diego Alves, 17, morador da Parada de Taipas e estudante do Cursinho Livre da Lapa. 

Mesmo sendo professor de Física no Cursinho Livre da Lapa, zona oeste, Tiago Almeida, 36, não deixou de levar suas alunas e alunos para a palestra. “Entre os autores exigidos pela Fuvest, ele é o único vivo. É uma oportunidade incrível para eles poderem ouvir e trocar com ele”. 

“Eu me interessei porque fiz um trabalho na escola sobre ele. Foi gratificante estudar sobre ele e vê-lo aqui. Foi muito legal ouvir as experiências dele”, diz a aluna do Cursinho Livre da Lapa, Laís Xavier, 17, da Freguesia do Ó. 

Pepetela é o primeiro autor que a estudante que quer cursar Direito conheceu  pessoalmente. “Há uma admiração em ver a pessoa que li, ouvindo falar sobre a escrita e trajetória dele”. 

LITERATURA DESPERTA CONSCIÊNCIA

Para quem fica se perguntando como fazer uma boa redação nas provas, Pepetela diz “escrevo para aprender, escrevo para pensar”. 

Para o autor de “O quase fim do mundo”, obra que traz muito do contexto angolano, “a  literatura é um despertador de consciência”, uma ferramenta importante para aguçar a curiosidade de uma comunidade e organizar o pensamento para novas estratégias. “A literatura cria hipóteses, mas a solução dos problemas só vem da sociedade”. 

A escrita foi sua maior estratégia durante os anos que atuou pela libertação de Angola. 

Pepetela lutou ao lado do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), nos anos 1970. 

À noite, quando as tropas deitavam as armas e Pepetela estava finalmente sozinho, a caneta e o papel se tornavam a melhor companhia e um modo de compreender as situações de guerra à sua volta.  

“Eu embrulhava o livro em um plástico e escondia em um buraco dentro de uma árvore. Em caso de desastre ou chuva, eu não o perderia. Às vezes, passava dias longe”, diz. 

Obra de escritor está na lista da Fuvest (Kapulana/Divulgação)

“A literatura angolana continua a ser periférica e marginalizada no contexto das literaturas mundiais. Um ou outro autor consegue publicar fora. Há número grande de escritores, mas que não saem de Angola”. 

Falando também para uma plateia de educadores, Pepetela diz acreditar que tanto esses profissionais, quanto os escritores podem colaborar para disseminar a literatura africana no Brasil.

BRASIL E ANGOLA

“Há uma semelhança muito grande entre Angola e Brasil. Que é a capacidade de rir”, diz o escritor, que também lembra como autores e artistas brasileiros, como Graciliano Ramos e Jorge Amado, influenciaram a literatura e a cultura angolana. 

“Mesmo vivendo em uma situação de ditadura, não havia censura de livros brasileiros em Angola; livros que formaram toda uma geração”.

Os angolanos também receberam apoio intelectual com visitas de cantores como Chico Buarque de Holanda, compositor da canção Morena de Angola, interpretada por Clara Nunes.

“O Chico é reconhecido internacionalmente. Ele não precisa de certificado de prêmios”, diz, ao ser questionado sobre a polêmica do Prêmio Camões, que Chico Buarque não pode receber sem autorização do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL). 

Na política, Angola também se espelhou muito no Brasil, criando em 1951 o Partido Comunista de Angola, inspirado na sigla brasileira. 

A palestra foi parte do 2° Encontro Literário Áfricas, Memórias e Resistência, organizado pelo Coletivo de Educadores Perus-Pirituba, com apoio de Rita Chaves, especialista em literatura africana de Língua Portuguesa e professora da USP. 

Para a professora, embora a ligação dos dois países comece de forma dolorosa, diante da realidade da escravidão, é importante ressaltar como a cultura une as duas nações. 

“Uma história de troca que começa da pior forma possível pode ser transformada e gerar um diálogo que nos traz numa sexta à noite pra baixo de uma árvore, para falarmos de literatura, de história e resistência”, afirma. 

“O Brasil está enfrentando um recuo, que ameaça nossa estabilidade, mas essa esperança tem que ser capaz de promover a mudança. A literatura traz imaginação, nos tira da vida para nos devolver mais fortes dessa vida”, ressalta.

Jéssica Moreira é correspondente de Perus

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“A arte nos coloca no mapa”, apontam artistas que fazem celebração dos 85 anos de Perus https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/09/20/a-arte-nos-coloca-no-mapa-apontam-artistas-que-fazem-celebracao-dos-85-anos-de-perus/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/09/20/a-arte-nos-coloca-no-mapa-apontam-artistas-que-fazem-celebracao-dos-85-anos-de-perus/#respond Fri, 20 Sep 2019 13:36:30 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/09/foto-3-e1568982314804-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=16783 Jéssica Moreira

“Norte e Nordeste compõem essa minha quebrada. Fica na beira da estrada e tem um fundo que é mata. São Paulo já é grande, mas esse bairro ainda alarga”. 

O verso, marcado pela geografia periférica, é da cantora e compositora Ariany Marciano, 23, que junto a outros artistas de Perus, região noroeste de São Paulo, celebram no Festival Mupope (Música Popular Periférica) os 85 anos do bairro com ares de interior e histórico de lutas. 

Organizado pelo Mapp (Movimento Arte Plural Perus), o evento traz para as principais ruas da região 22 atrações artísticas como shows, batalhas de rap, performances, cortejo e também gastronomia. 

O evento foi custeado pela verba adquirida por edital do Proac (Programa de Ação Cultural em SP) e também apoio de comerciantes locais. 

Uma das atrações é MC Neguinho da Kaxeta, que foi um dos mais pedidos pela população do bairro em enquete realizada pelo Mapp. O MC toca no encerramento do evento, no domingo (22). 

A ideia do movimento é reforçar a identidade dos moradores com o bairro. “A vida toda a gente ouve pessoas dizendo que nunca nem escutaram falar sobre o local onde a gente mora”, diz Ariany. “Isso reverbera na gente, nos fazendo questionar se nosso lugar existe mesmo, já que ninguém ouviu falar. Um festival como esse nos coloca como sujeito, mostra que nossos passos existem”. 

Grupos culturais da região de Perus querem reforçar vínculo de moradores com o bairro (Divulgação)

HISTÓRIA

São 85 anos no papel, já que o surgimento de Perus vem muito antes, com a construção das primeiras linhas de trem nos anos 1860 pela São Paulo Railway. O mesmo trajeto é utilizado para o transporte público pela linha 7-rubi da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). 

Reza a lenda que a região era uma parada de tropeiros, onde uma dona de nome Maria criava Perus. A resistente fábula da “Maria dos Perus” atravessa gerações e dá nome à praça de alimentação do evento, localizada na entrada do Recanto dos Humildes, com comidas típicas. 

“Essa proposta surgiu após percebermos que não fazia sentido celebrar a história do bairro e não ter as personalidades importantes que construíram o chão e a história desse lugar”, afirma Valéria Motta, 38, pedagoga e articuladora cultural, e uma das organizadoras do evento. 

A verdade por trás da anedota, no entanto, é que a palavra Perus é um derivado de “Peri”, que em tupi-guarani significa água entre as pedras, uma característica muito presente na geografia da região. 

Em 1923, o bairro foi berço da primeira fábrica de cimento do Brasil – a Companhia de Cimento Portland Perus, onde ocorreu uma greve que perdurou longos sete anos, de 1962 a 1969, colocando a região na história do movimento sindical de todo o país e do mundo. 

Os Queixadas, alcunha dada aos sindicalistas dessa paralisação, também serão homenageados com o nome de um dos palcos, na Praça Sales, na sexta-feira (20). Será nela a abertura do evento, com projeções audiovisuais e performances, das 18h30 às 21h. 

A história dos trabalhadores já foi tema de peças de teatro, trilhas de memória, livros e filmes, e é constantemente relembrada por coletivos culturais. Eles reivindicam a criação de um centro cultural e de uma universidade desde que a indústria foi fechada, no fim dos anos 1980. 

“Somos gratos por aqueles que amassaram o barro pra gente chegar até aqui. Estamos trazendo isso para que a história não seja esquecida e que possa inspirar a juventude cada vez mais”, aponta Valéria. 

Para os organizadores, é essa memória de luta e resistência que os inspira e deu gás também para o surgimento do Movimento Hip Hop peruense. 

Foi a partir de mcs, rappers, dançarinos de break e djs da região que Perus entrou para a cena do hip hop da São Paulo dos anos 1990. Sérgio Barbosa (VL), 40, um dos precursores do movimento em Perus e também integrante do Mapp, relembra como era ir de Perus a Diadema ou à zona leste para fazer articulações. 

“Perus é onde começou a nossa história de vida e existência. A arte nos mantém em pé”, conta VL, que também ressalta a importância do samba local. 

O palco principal, na avenida Dr. Silvio de Campos, recebe o nome de Valenças, que é o mesmo nome da escola de samba do bairro. 

“Envolver os artistas e moradoras à celebração de aniversário do bairro cria um sentimento de pertencimento e é também um exercício de cidadania com as pessoas que moram e contribuem para o avanço do nosso território”, aponta Juliana Sete, 35, MC, produtora musical e parte do Mapp. 

PROGRAMAÇÃO

Na noite de sexta-feira (20), haverá a abertura do evento, com vídeos e performances que trazem o lema do festival “a periferia é o centro”, na Praça Sales, conhecida como rua da feira da estação Perus.

No sábado (21), das 13h às 21h30, as atrações ficam na Casa Hip Hop Perus, na Rua Julio Maciel, 550, onde também estará concentrada a praça de alimentação. Haverá rap, batalhas de rimas e apresentações de dança das crews. No domingo (22), o encerramento terá apresentações de samba e do MC Neguinho da Kaxeta. A programação completa está na página do Mupope.

Paralelamente à programação, haverá ações organizadas pela Subprefeitura de Perus, que divide o palco da Av. Dr. Silvio de Campos com atrações como Rodriguinho, ex-Travesso, Fundo de Quintal e Sula Miranda. 

Jéssica Moreira é correspondente de Perus

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Em Perus, lanchonete Dan Dog atrai público com 50 opções de lanches https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/07/12/em-perus-lanchonete-dan-dog-atrai-publico-com-50-opcoes-de-lanches/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/07/12/em-perus-lanchonete-dan-dog-atrai-publico-com-50-opcoes-de-lanches/#comments Fri, 12 Jul 2019 19:17:12 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/07/x_contra_file_03-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=16457 Ira Romão

Quando abriram uma lanchonete há 19 anos, a ideia de Alfredo Clóvis Lázaro, 50, e Darci Aparecida Lázaro Catelani, 54, era trabalhar com a venda de cachorro-quente em Perus, na zona noroeste de São Paulo.

Hoje, o Expresso Dan Dog conta com um cardápio que contém mais de 50 opções de lanches, que custam entre R$ 8,50 e R$ 25, dentre eles sete tipos de hot-dog. 

“Quem foi direcionando nosso trabalho e aumentando o leque do cardápio foram os próprios clientes. Eles iam pedindo outras opções de lanches e nós começamos a incrementar”, relata Alfredo. 

O espaço comandado pelos irmãos é um dos principais points gastronômicos de Perus.

Eles contam que a ideia surgiu por sentirem falta no bairro de um local mais tranquilo para bater um papo e que oferecesse algo que acolhesse as famílias.

“Nós comíamos um cachorro-quente lá pelos lados da Freguesia do Ó. Gostávamos de lá, do lanche e do formato que era na baguete. Então decidimos montar uma lanchonete para vender só hot-dog preparado na baguete e bebidas enlatadas”, relembra Alfredo.

Alfredo e Darci apostam na lanchonete desde o início dos anos 2000 (Ira Romão/Agência Mural/Folhapress)

A escolha do nome Dan Dog tem um significado especial para os sócios. “Dan” vem de Danilo, em homenagem ao filho de Darci, que morreu aos 12 anos, quando o projeto da lanchonete estava em desenvolvimento. E o “Dog” corresponde à ideia inicial de vender apenas hot-dog.

Localizado na Avenida Comendador Fiorelli Peccicacco, uma das principais vias de Perus, o Dan Dog funciona de terça a domingo, das 11h à meia-noite, e atrai diferentes públicos. Eles estimam que, em média, passam pelo local cerca de 200 clientes por noite.

Antes, no mesmo endereço, existia um depósito de areia. Ao locar parte do terreno, os irmãos construíram um salão e uma cozinha para poder abrir o negócio. 

O estabelecimento oferece ainda porções, refeições completas, sobremesas e conta com variedade de bebidas alcoólicas e não-alcoólicas.

Embora a principal opção de lanche seja o hot-dog, o campeão de vendas da casa é outro. “O [lanche] disparado é o x-contra filé com bacon, seguido da porção de tilápia. No terceiro lugar aparecem os hot-dogs especiais com frango e com catupiry”, aponta Darci.

Área externa do Expresso Dan Dog (Ira Romão/Agência Mural/Folhapress)

RELAÇÃO COM OS CLIENTES 

Mesmo fechando as portas meia noite, o atendimento continua até que o último cliente peça a conta.  

A cabeleireira Camila Barreto, 25, não esquece uma vez em que estava com os amigos e ao saírem tarde da noite do boliche, no Shopping Center Norte, não encontraram lugar aberto para comer. 

“Chegando em Perus, quase de madrugada, decidimos verificar se o Dan Dog estava aberto. Por sorte fomos atendidos”.

Além de trazer recordações, para alguns clientes a lanchonete é também ponto de referência.

“Venho aqui desde os 15 anos. Moro a cinco minutos daqui. E quando preciso dar referência do meu endereço, indico o Dan Dog. As pessoas conhecem mais do que a própria estação de trem”, afirma a analista administrativo Taís Oliveira, 31.  

Em 2005, houve a expansão física do espaço, quando surgiu a necessidade de criar uma área exclusiva para não-fumantes. Como na época, ainda não vigorava a Lei Antifumo nº 12.546/2011, que proíbe fumar em locais totalmente ou parcialmente fechados, muitos clientes fumavam próximos a outros, e isso incomodava os não-fumantes. 

Porção de tilapia no Dan Dog (Ira Romão/Agência Mural/Folhapress)

Como solução, os irmãos locaram mais uma parte do terreno do antigo depósito. Ampliaram a cozinha e construíram outro salão, reservado para clientes não-fumantes, na época, um diferencial no bairro.  Como resultado, conquistaram novos clientes.  

“Até hoje, mesmo não podendo fumar em locais fechados, muitas famílias que frequentam aqui gostam de ficar naquele salão”, relata Darci. 

Com a ampliação do espaço físico, surgiram novas demandas. “O pessoal começou a pedir comida. As firmas da região procuravam a gente para servir almoço. Foi quando inserimos no cardápio refeições”, explica a proprietária. 

A sociedade entre os irmãos é anterior ao restaurante. Eles chegaram a administrar simultaneamente três cantinas em escolas públicas. Por conta disso, muitos clientes antigos os chamam, até hoje, de “tios”. 

“No início tínhamos um público muito jovem em decorrência das escolas. Hoje eles continuam vindo, mas boa parte já estão casados e com filhos”, menciona Alfredo.

Ira Romão é correspondente de Perus
iraromao@agenciamural.org.br

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De Perus à África: Trupe Liuds leva espetáculo sobre mulher negra para Moçambique https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/06/17/de-perus-a-africa-trupe-liuds-leva-espetaculo-sobre-mulher-negra-para-mocambique/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2019/06/17/de-perus-a-africa-trupe-liuds-leva-espetaculo-sobre-mulher-negra-para-mocambique/#respond Mon, 17 Jun 2019 17:46:41 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2019/06/WhatsApp-Image-2019-06-17-at-14.31.25-320x213.jpeg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=16349 Jéssica Moreira

Uma boneca africana inicia uma longa trajetória em busca das raízes ancestrais. Criada pela Trupe Liuds, em Perus, na região noroeste de São Paulo, a história de Mjiba – a boneca guerreira – atravessou o Oceano Atlântico e chegou às crianças da Maputo, em Moçambique.

A trupe viajou na primeira semana de junho para o continente africano, onde ficará até o final do mês.

Formada pelos palhaços Torradinho (Valmir Santana), 29, Candango (Clébio Ferreira), 34, e Gigica (Girlei Miranda), 57, a peça foi uma das selecionadas pelo FITI (Festival Internacional de Teatro de Inverno) de Maputo.

A trupe também está ministrando oficinas de comicidade negra e faz debates com artistas da região.

Para os integrantes, a viagem até Moçambique simboliza um verdadeiro fechamento de ciclo, seja para o grupo, que agora inicia novas pesquisas, quanto para a personagem Mjiba, que finalmente encontra as origens africanas.

Cangango, Gigica e Torradinho formam a Trupe Liuds (Divulgação)

“O espetáculo levanta discussões bem relevantes ao atual momento da luta das mulheres e principalmente das mulheres negras, e faz com que crianças e jovens discutam as formas de educação impostas, que na maioria das vezes é opressora e machista”, aponta Clébio, o palhaço Candango.

O espetáculo conta a história de dois palhaços carteiros que, ao se depararem com uma encomenda sem remetente, encontram algo inesperado dentro dessa caixa: uma boneca negra.

De forma leve e ao mesmo tempo educativa, os palhaços falam sobre a história da colonização e da escravidão que atravessa o Brasil pela ótica da mulher negra, trazendo ao palco as discussões sobre a padronização da imagem feminina.

TRUPE

Criada em 2006, com o intuito de difundir a arte circense na periferia de São Paulo, a trupe é uma companhia composta por palhaços negros e moradores da periferia.

Eles utilizam a linguagem lúdica para recriar a realidade cotidiana e, assim, despertar o imaginário das pessoas em relação à questão de raça.

Na peça, dois carteiros encontram uma caixa com objeto misterioso (Clayton João/Divulgação)

Misturando  cenas do circo tradicional à cultura popular, a Trupe Liuds também tem como proposta ocupar espaços públicos e espaços ociosos com espetáculos, oficinas e intervenções circenses.

Para os integrantes, estar no continente africano é um caminho para conhecer mais da história ancestral brasileira e desmistificar a região, muitas vezes representada de maneira negativa pelos livros didáticos.

“A África sempre fez parte do nosso imaginário, e hoje ter a oportunidade de vir até aqui para trazer  o nosso trabalho é maravilhoso”, avalia Valmir Santana, o palhaço Torradinho. “Realizar esse intercâmbio nos fortalece e nos dá mais energia para fazer mais pela nossa comunidade, dando dimensão de outras realidades e lógicas e como elas operam no mundo.”

Em março de 2019, Moçambique foi um dos países devastados pelo Ciclone Idai, deixando milhares de pessoas mortas e diversas regiões destruídas. A trupe entende que levar a peça para o país neste momento é um jeito de prestar solidariedade.

“Pensamos ser de extrema importância poder compartilhar nossa arte com esse povo nesse momento. Sabemos que não será fácil, pois estamos em um lugar diferente do nosso, mas compartilhamos a mesma luta. Estamos de coração aberto e dispostos a contribuir para uma troca sincera e profunda”, diz Girlei, a palhaça Gigica.

Jéssica Moreira é correspondente de Perus
jessicamoreira@agenciamural.org.br

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Moradores ganham renda extra com aluguel de garagens nas periferias de SP https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/12/11/moradores-ganham-renda-extra-com-aluguel-de-garagens-nas-periferias-de-sp/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/12/11/moradores-ganham-renda-extra-com-aluguel-de-garagens-nas-periferias-de-sp/#respond Tue, 11 Dec 2018 11:59:41 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/12/IMG_9698-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=15129 Ira Romão
Eduardo Silva

A dona de casa Alzerina Alves de Oliveira, 58, nunca colocou uma placa de aluga-se para a garagem que tem em cima de casa. Mas há 10 anos é procurada para alugar o espaço no Jardim do Russo, em Perus, na zona norte de São Paulo.

“Desde que fechamos com portão, mesmo quando ainda não tinha laje, sempre aparece alguém perguntando se está vazia, mostrando interesse em alugar”, afirma.

A busca foi tanta que ela cedeu. Hoje, recebe R$ 80 por mês com a locação. Há vizinhos e conhecidos que também alugam garagens por preços que vão até R$ 300 e viram uma nova opção de renda.

Com as duas filhas desempregadas, Alzenira conta apenas com a aposentadoria do marido. “Esse dinheiro [do aluguel] me ajuda ao menos com as despesas diárias de casa. Muitas vezes, é com ele que compro o gás de cozinha”, explica.

Três inquilinos usaram a área ao longo da década. Todos conhecidos dela. Os acordos foram sempre apenas pela palavra do locatário e ela nunca assinou um contrato. Confiança é o que rege essas relações. “Tomo sempre cuidado para quem vou alugar. Afinal, a garagem dá acesso direto à minha casa. Penso na privacidade da minha família e na relação com o inquilino”, fala.

Ela já pensou em deixar de usar o local até por causa da obra que o marido, que é pedreiro, tem feito na casa. “Fico preocupada quando temos que carregar material de construção e o carro está na garagem. E também quando vem crianças aqui e querem brincar no quintal. Nestes momentos coloco um lençol no carro para não arranhar”, conta.

A dona de casa Sandrelma aluga dois espaços (Ira Romão/Agência Mural/Folhapress)

Ao longo desses 10 anos, dois meses foi o maior tempo que o espaço ficou vazio. Até hoje, mesmo com a garagem alugada, ela recebe semanalmente propostas de pessoas que passam em frente à residência, inclusive com valores mais altos.

Mesmo assim, ela mantém o acordo firmado com o atual inquilino. Num futuro próximo, sonha em finalizar a ampliação da casa e, quem sabe, uma das filhas adquira um carro.

LOCADOR

A procura por garagens segue também o fato do aumento no número de veículos na cidade. A capital conta com 5,7 milhões de carros, segundo o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), uma alta de 34% em dez anos quando mais de 1 milhão de carros foram emplacados no município.

O empresário Maurício Silva, 33, reside na mesma rua que Dona Alzerina, mas não tem garagem. No entanto, é proprietário de quatro veículos.

Ele aluga duas garagens distintas por R$ 150 e R$ 170 – cada uma comporta dois carros. Antes, chegou a pagar R$ 600 por mês com aluguel. 

Duas ruas acima da casa de Maurício, reside a dona de casa Sandrelma Teotônio de Souza, 46. Ela é locatária de duas garagens.

A primeira foi planejada para isso. Há dois anos, decidiu construir uma garagem apenas para alugar. Desde que ficou pronta, está alugada para o mesmo inquilino por R$ 130.

A segunda é um espaço simples, coberto por telhas, que dá acesso à casa de Sandrelma. Um dia ela emprestou para um vizinho estacionar o carro, o que despertou interesse de outro morador. O local improvisado está alugado por R$ 100.   

Sônia e Maria de Fátima alugam a garagem de casa para quatro inquilinos (Eduardo Silva/Agência Mural/Folhapress)

VILA CURUÇÁ

Quase 50 km dali, as cabeleireiras Maria de Fátima Monteiro, 56, e Sônia França, 55, alugam a garagem da casa onde moram para quatro inquilinos, no Jardim dos Ipês, distrito da Vila Curuçá, no extremo leste da capital paulista.

Ao todo, são cinco carros e uma moto que dividem o quintal das moradoras com dois cães de estimação.

O negócio começou há dois anos, sem que tivessem essa intenção. “As pessoas perguntavam se a gente poderia alugar a garagem porque o espaço aqui é grande e elas estavam deixando o carro na rua”, conta Fátima.

O primeiro inquilino foi o marido de uma cliente do salão de cabeleireiro onde as duas são sócias e, de acordo com elas, nunca houve problemas de privacidade. O locatário fica com uma cópia da chave do portão para ter mais liberdade para entrar e sair com o veículo.

Sônia destaca, contudo, que só aceita alugar para vizinhos ou conhecidos, e que o espaço já atingiu a lotação. “Às vezes, as pessoas vêm até aqui perguntar se podemos liberar mais uma vaga. Mas não tem jeito. A gente tem os cachorros, que são grandes, aí ficaria apertado para eles, fora que eles podem arranhar ou pular em cima dos veículos”, diz.

Assim como Dona Alzerina, as cabeleireiras também recebem R$ 80 pelo aluguel de cada carro. “É um preço bem abaixo do que é cobrado por aqui. Pelo o que a gente sabe, tem gente que aluga por R$ 120”, comenta Fátima.

Três quarteirões abaixo, o cabeleireiro Zima de Lima, 54, também possui um salão e aluga o espaço anexo para três pessoas. O local é um terreno que estava sem uso e há cinco anos passou a ser utilizado por dois vizinhos e pelo irmão dele, que possui uma van.

Para cada veículo, Lima cobra R$ 120. A renda extra o ajuda a pagar o plano de saúde da esposa.

Além do contrato feito diretamente com proprietários da garagem, empresas na região do Itaim Paulista, ao lado da Vila Curuçá, também oferecem estacionamentos para mensalistas.

O Itaim Park cobra R$ 150 (com horário fixo, de segunda a sábado), e o Betha Park, com o valor mensal de R$ 120 e funcionamento 24 horas.

Ira Romão é correspondente de Perus
iraromao@agenciamural.org.br

Eduardo Silva é correspondente de São Miguel Paulista
eduardosilva@agenciamural.org.br

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Jovem de Perus cria marca de roupas para fortalecer identidade negra https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/21/jovem-de-perus-cria-marca-de-roupas-para-fortalecer-identidade-negra/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/11/21/jovem-de-perus-cria-marca-de-roupas-para-fortalecer-identidade-negra/#respond Wed, 21 Nov 2018 20:17:22 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/WillianNaLojaLancada-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14900 Jéssica Moreira

Símbolos africanos, cores e acessórios que trazem nas formas e texturas a história da população negra no Brasil. É desse modo que nasceu, no domingo (18), o Espaço Afro Perifa, no bairro de Perus, região noroeste de São Paulo.

A ideia partiu do estilista Willian André, 23, de fortalecer a estética e identidade preta de crianças e adolescentes na região.

André tem trabalhado com o tema desde 2016, quando criou o Projeto Afronte Empodere-se, com eventos que mesclam moda, rap, grafite e demais expressões culturais pretas.

“A ideia é trazer a questão da moda e da estética negra como auto-estima, para o empoderamento dos nossos na periferia e da favela”, conta.

Grupo já atua há um ano com vendas online e lançou espaço físico (Ana Carla Olive/Divulgação)

A marca foi lançada em novembro de 2017, com uma loja virtual que funcionava por meio do Instagram. “De maio para setembro, muitas pessoas quiseram adquirir as roupas, foi lindo de ver pretos e pretas usando a marca”.

Moradora de Perus e estudante de psicologia, Caroline Oliveira Santos, 20, está desde 2016 no Afronte Empodere-se. Ela afirma que uma marca de roupas que trata sobre ser preto na periferia fortalece a questão da representatividade.

“Usar peças que trazem nossos traços estampados é ocupar mais um lugar que estava vazio na sociedade, porque andando em lojas de shopping, por exemplo, ao ver uma pessoa estampada na roupa, ela é branca”, explica. 

“A gente cresce se olhando no espelho e procurando o europeu padrão. Ao nos olhar no espelho, procurando esse tal do europeu, e não encontrar os traços que são os ditos bonitos, como gostar de nós?”, completa.

Ela afirma que essa percepção traz um sentimento de inferioridade, que só pode ser vencido com a criação de outros tipos de espaços. “Saber que somos lindos do nosso jeito e assumir uma postura que mostra que não estamos pra brincadeira mesmo com todas as dificuldades que enfrentamos.  Não ficamos só na moda, fomos além, é militância por nós em qualquer sentido”, conclui Carolina.

Willian André, criador do AfroPerifa (Divulgação)

AFROEMPREENDEDORISMO

Willian tem promovido desfiles em espaços culturais pelo bairro, com parcerias com a Casa do Hip Hop Perus, a Comunidade Cultural Quilombaque, a Biblioteca Padre José de Anchieta e feiras de empreendedorismo em outros locais da capital de São Paulo.

Ele também realiza parceria com grafiteiros moradores da região. Em janeiro, ao lado do grafiteiro Consp, a marca lançou o editorial Inverno de Flores, um conjunto de cinco estampas que contava a trajetória do negro.

Para custear o aluguel da loja, Willian firmou uma parceria com uma de suas tias. Nos fundos funciona um salão de beleza e na frente sua loja.

“Algo fundamental para eu entrar nesse mundo foi saber que eu sou um afroempreendedor. A palavra afro muda completamente a questão do conceito do empreendedorismo, dividindo-o em dois”, afirma.

Ele parte da ideia da importância em empreender com a própria estética e identidade, além de retomar as raízes.  “Trazendo os pretos para estar nesse mundo dos negócios, fazer com que eles consumam de “nós para nós”, fazer com que eles atuem conosco”.

Assista: com grafite e moda, jovens de Perus fortalecem o orgulho de crianças e adolescentes negros

Willian destaca que o desafio começa por ele ser um homem jovem negro e da periferia. “A gente não tem essa cultura do empreendedorismo. Então, se torna mais difícil”.

Uma pesquisa do Instituto Locomotiva/Instituto Feira Preta, que entrevistou 255 afro empreendedores no Brasil, divulgada nesta semana, mostra que 94% dos empreendedores negros dizem que já sofreram algum tipo de preconceito. Além disso, 80% apontaram como maior desafio conseguir crédito bancário, e 57% disseram se sentir constrangidos ao ir ao banco para solicitar crédito.

Para driblar essas questões, Willian tem participado de cursos sobre negócios.

“Meu maior desafio foi [entender] essa questão de investimento, de fluxo de caixa. Consegui me adaptar melhor. Eu não consigo sobreviver somente da marca ainda. Sou coordenador do CJ (Centro Para a Juventude de Perus), então o salário do CJ me ajuda nessa questão do aluguel e me ajuda no investimento para a marca”.

Jéssica Moreira é correspondente de Perus
jessicamoreira.mural@gmail.com

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Tradição do jongo reforça identidade negra em Perus

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Falha na linha 7-rubi da CPTM deixa milhares sem trem no horário de pico https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/09/18/falha-na-linha-rubi-da-cptm-deixa-milhares-sem-trem-no-horario-de-pico/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/09/18/falha-na-linha-rubi-da-cptm-deixa-milhares-sem-trem-no-horario-de-pico/#respond Tue, 18 Sep 2018 11:46:09 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/WhatsApp-Image-2018-09-18-at-08.30.03-320x213.jpeg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14370 Jéssica Moreira
Betiane Silva

Desde que as chuvas voltaram a São Paulo, os trens da linha 7-rubi estão funcionando a baixa velocidade. Hoje, a máquina parou de vez. Desde antes as 8h da manhã desta terça-feira (18), os trens tiveram o funcionamento interrompido, por conta de problemas de energia, sem previsão de retorno.

Ônibus que circulam em direção a Lapa e Barra Funda estavam lotados na região de Perus. A falta de transporte causou confusão em várias estações, especialmente Caieiras , Franco da Rocha e Perus.

A situação complicou moradores da zona norte de São Paulo e de cidades da Grande São Paulo.

“Moro em Franco da Rocha, estava indo para a faculdade na Barra Funda, a Uninove, e os trens pararam. De faculdade, vou levar falta. Estou aqui tentando ver um jeito de voltar para casa”, afirma a estudante Lenice Maria, 22.

Lenice conta que já viveu problema parecido há alguns meses. “Fiquei quatro horas esperando o ônibus e passei quatro horas para chegar em casa”.

Moradores aguardam serviço de ônibus em Caieiras (Betiane Silva/Agência Mural/Folhapress)

Também moradora de Franco da Rocha, a auxiliar de limpeza Edileuza da Costa, 54, trabalha na Avenida Paulista. “Meu chefe vai entender [o atraso], mas um dia eu perco[o emprego] . É ruim pra mim”, afirma. “Só eu que trabalho sozinha na minha casa, a linha pior que tem na face da terra é em Franco da Rocha, porque todo fim de semana estão arrumando, a linha é uma desgraça”.

Devido ao problema, o preço das corridas de Uber disparou. Uma viagem de Perus até a Barra Funda chega a custar R$ 123, sendo que em condições normais sai em torno de R$ 60.

“Não é tão longe e estou aqui parada”, diz a ajudante de limpeza Jéssica Ferreira, 24. Ela mora em Caieiras e chegou 8h20 na estação da cidade para pegar o trem com destino ao Jaraguá, onde entra no trabalho às 9h30. “Os ônibus não tem condição de pegar para ir para lá, estão muito cheios”. Ela conta que na última pane, entrou no serviço às 13h.

Segundo o site da CPTM, houve problemas técnicos no sistema de energia, com circulação interrompida entre as estações Vila Aurora e Caieiras. “Foi acionada a Operação Paese, com ônibus gratuitos, entre as estações Pirituba e Caieiras, sendo cancelada às 11h devido à redução da demanda de usuários. A circulação deverá ser normalizada às 13h”, diz a CPTM, em nota. 

A companhia alega que houve furtos de equipamentos do sistema de rede aérea (pesos de ferro que sustentam a rede autocompensada). A empresa diz que dois suspeitos foram identificados e encaminhados à Delpom (Delegacia do Metropolitano) para apuração.

Jéssica Moreira e Betiane Silva são correspondentes de Perus e Franco da Rocha
jessicamoreira@agenciamural.org.br
betianesilva@agenciamural.org.br

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Tradição do jongo reforça identidade negra em Perus https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/08/29/tradicao-do-jongo-reforca-identidade-negra-em-perus/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2018/08/29/tradicao-do-jongo-reforca-identidade-negra-em-perus/#respond Wed, 29 Aug 2018 16:41:20 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2018/08/2E9A2831-320x213.jpg https://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=14237 Era uma terça-feira, trem lotado e a chuva se aproximava. Próximo da estação da CPTM de Perus, região noroeste de São Paulo, o som dos tambores podiam ser ouvidos do começo da Travessa Cambaratiba.

A viela cheia de grafites tem como destino a Comunidade Cultural Quilombaque, que há 13 anos dissemina cultura e história afro-brasileira no bairro.

Ao chegar, as palmas ritmadas misturadas aos toques no tambor anunciavam que era ali mesmo que tinha início a prática do jongo, expressão cultural afro-brasileira típica do Sudeste que une percussão de tambores, dança coletiva e elementos que trazem a história e identidade negra presente na região.

Em Perus, o jongo se tornou uma prática constante em 2014, quando integrantes da Quilombaque intensificaram pesquisas sobre tambores e danças afro-brasileiras e entraram em contato com outras comunidades jongueiras.

“Decorar ponto de jongo é decorar memória”, explica o ator e arte-educador Valmir Santana, 28, integrante do Jongo do Coreto. “É uma experiência de inteligência social. Uma assembleia, um momento que a gente está se olhando. A ancestralidade nos traz como fazer isso, que é formar a roda, bater palma, cantar os pontos, respeitar o tambor e os mais velhos”, ressalta.

No bairro, a prática foi nomeada de Jongo do Coreto, homenagem a um coreto demolido pela prefeitura em 2009, situado na Praça Inácio Dias, principal ponto de encontro da juventude peruense.

“O jongo chega com o significado de resistência acima de tudo”, aponta o educador e integrante do Jongo do Coreto, Almir dos Santos, 31.

HISTÓRIA E IDENTIDADE

“Ô, mãe África, vem lembrar seu cativeiro. Olha só o meu tambú, como chora o candongueiro, e de tanto soluçar, soluçar vai molhar o meu terreiro”.

A letra acima, tocada hoje em dia também pelo Jongo do Coreto, é o que os participantes de jongo – jongueiros – chamam de ponto.

A tradição teve início quando os negros escravizados utilizavam o jongo como uma maneira de se comunicar com os companheiros, sem o risco de que os senhores entendessem a mensagem.

Os saberes tradicionais dos povos negros escravizados eram rechaçados pela sociedade brasileira. Mesmo antes da chamada abolição da escravidão, em 1888, as várias formas de expressão dos negros sofreram repressão direta com legislações.

Como exemplo, a lei nº 3 de 16/01/1893, do Código Municipal da antiga Vila Vieira de Piquete (que se tornou o atual município de Piquete, no interior paulista), proibiu “batuques, sambas, cateretês, cana-verde e outros”. Havia medo constante por parte dos senhores de fazenda que os povos negros se organizassem.

Jongo começou a ser praticado em Perus em 2014 (João Paulo Brito/Agência Mural/Folhapress)

PATRIMÔNIO NACIONAL

O jongo foi considerado um Patrimônio Cultural Brasileiro, em 2005, pelo Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

No processo, o órgão identificou que práticas semelhantes aconteciam em regiões onde havia algum conflito sócio-racial, como discriminação, tanto nas regiões rurais quanto nas periferias das cidades, como é o caso de Perus.

Há diversas comunidades jongueiras no Brasil. Porém, segundo estudos realizados pelo Iphan, a prática se consolidou na região Sudeste, principalmente entre negros e negras que trabalhavam nas lavouras de café e cana-de-açúcar.

Dentre as comunidades jongueiras mais tradicionais, é possível citar a Comunidade Morro da Serrinha (RJ), Comunidade da Fazenda São José (RJ), Jongo de Guaratinguetá (SP), Cunha (SP), Piquete (SP), São Luís do Paraitinga (SP) e Lagoinha (SP).

Cada território toca e dança de maneiras distintas. Perus, por exemplo, não realiza um jongo tradicional, mas tenta repassar a expressão para as crianças e jovens na periferia de São Paulo, com o objetivo de ensinar e fortalecer as identidades negras ancestrais.

“Estamos dentro de um contexto da periferia, temos que ter respeito à tradição, mas África é uma constante reinvenção”, aponta Almir.

Jéssica Moreira e João Paulo Brito são correspondentes de Perus e Vila Nova Cachoeirinha
jessicamoreira@agenciamural.org.br
joaopaulobrito@agenciamural.org.br

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Aos 12 anos, menino de Perus publica livro de poesia sobre história negra no Brasil https://mural.blogfolha.uol.com.br/2017/12/12/aos-12-anos-menino-de-perus-publica-livro-de-poesia-sobre-historia-negra-no-brasil/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2017/12/12/aos-12-anos-menino-de-perus-publica-livro-de-poesia-sobre-historia-negra-no-brasil/#comments Tue, 12 Dec 2017 15:24:16 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2017/12/25035555_10210484117850468_2037328050_o-180x120.jpg http://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=12391 “Existe uma história do povo negro sem o Brasil, mas não existe uma história do Brasil sem o povo negro”. O trecho acima é parte de um dos poemas que integram o livro “A poesia corre em minhas veias”, lançado pelo poeta mirim Wesley Carlos Soares, 12.

Morador de Perus, região noroeste da capital paulista, o garoto se aproximou da poesia por meio da disciplina de história ainda quando estava no 5º ano do ensino fundamental, em 2015, em uma escola pública de seu bairro.

“A professora de história, Rosálio, pediu para fazer uma poesia de cordel e depois não parei mais”, conta o poeta, que impressiona com textos que tratam sobre genocídio da juventude negra, religiosidade e a importância da ancestralidade africana, como o poema completo, abaixo:

A favela pede paz

Existe uma história do povo negro sem o Brasil,
mas não existe uma história do Brasil sem o povo negro.
Genos, povo, raça, tribo, a destruição de um povo de uma nação.
Não queremos viver só chorando em cima de um caixão.
Ver negros, jovens de periferia estirados naquele chão.
Mas o pensamento da polícia é, se o negro correr, ele é ladrão.
77% das mortes de negros crescem a cada dia e o que a polícia diz:
– Eu não sabia.
Mas cansamos dessa vida.
Temos que ser capaz.
A favela pede paz!.

Para a produção do livro, Wesley contou com o apoio de seu irmão, Willian Soares, e da diretora da Biblioteca Padre José de Anchieta, Beth Pedrosa. “Eu nem sabia que poderia digitar e imprimir a capa. E saiu tudo muito ‘daóra’. Foi novo, pra mim, ver a capacidade para montar um livro”.

O menimo, que ainda gosta de brincar de esconde-esconde com seus amigos, sonha em, um dia, se tornar professor de história.

“Quando eu crescer quero ser professor de história, porque fico vendo nos livros alguns assuntos que ninguém nunca entendeu direito, aí eu vou lá e faço uma poesia como se fosse um resumo, um improviso. Eu acho que posso incentivar outras crianças lendo poesias para elas, ensinando a verdadeira história e ajudando no processo de desconstrução [dos preconceitos].”

Livo conta com 15 poesias e preço simbólico de R$ 2 (Viviane Prado/Divulgação)

Atualmente, Wesley integra o coletivo artístico e independente Afronte Empodere-se, fundado pelo irmão Willian em 2016, e tem como objetivo o empoderamento de pretos e pretas da periferia por meio da moda.

“Para o Wesley, assim como todo o restante do grupo, foi uma vivência muito bacana, de desconstrução e construção da identidade de nós mesmos. Desde o nosso primeiro evento o Wesley tem participado com poesia e percebo que cada vez mais ele escreve sobre os negros. Ele faz parte do Centro da Criança e do Adolescente (CCA), onde ele pode servir de inspiração para outros jovens como ele, mostrando que podem lançar um livro.”

O livro “A poesia corre em minhas veias”, impresso em papel reciclável, traz 15 poesias e custa um valor simbólico de R$ 2, que é para colaborar na impressão de novos exemplares para o poeta continuar apresentando seu livro em saraus pelas periferias de São Paulo.

Jéssica Moreira é correspondente de Perus
jessicamoreira.mural@gmail.com

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Moradores questionam reformas em protestos nas periferias de São Paulo https://mural.blogfolha.uol.com.br/2017/04/29/moradores-questionam-reformas-em-protestos-nas-periferias-de-sao-paulo/ https://mural.blogfolha.uol.com.br/2017/04/29/moradores-questionam-reformas-em-protestos-nas-periferias-de-sao-paulo/#comments Sat, 29 Apr 2017 11:01:25 +0000 https://mural.blogfolha.uol.com.br/files/2017/04/foto-10-180x101.jpg http://mural.blogfolha.uol.com.br/?p=11176 “Nada mais legítimo do que se juntar à nossa classe para protestar. Acho que essa é única arma que a gente tem: povo organizado e povo na rua!” Foi assim que Keli Domingues, 36, responsável por uma casa de atendimento à mulheres vítimas de violência doméstica, reafirmou a sua adesão à greve que ocorreu ontem (28) em diversas cidades do país.

Moradora de Guaianases, na zona leste de São Paulo, ela foi ao largo da Batata protestar contra as reformas trabalhista e da Previdência. “Me juntei a greve de hoje justamente porque eu faço parte desse grupo de trabalhadores ou da classe trabalhadora que será prejudicada com as reformas desse governo ilegítimo e golpista”, defendeu.

Para chegar ao ponto de encontro do ato, na zona oeste, Keli utilizou um ônibus fretado por coletivos da região. A quase 70 km de Guaianases, o professor e terapeuta holístico Paulo Rudo, 32, também contou com o transporte disponibilizado por movimentos sociais para sair do Grajaú, no extremo sul de São Paulo.

Entre as reivindicações do professor, estão as reformas estruturais propostas pelo governo do presidente Michel Temer (PMDB). “Que cobrem as dívidas de quem deve e mudem a aposentadoria dos parlamentares”, sugeriu Paulo.

Na opinião do morador, as alterações das leis de trabalho e a mudança de regras da aposentadoria são medidas para driblar a atual crise do sistema capitalista. “O filho da empregada doméstica não acessava a universidade. Agora ele acessa e faz a faculdade junto com o filho do patrão. Isso é algo muito interessante e curioso na história do Brasil”, diz Paulo, ao sugerir que as reformas podem reduzir direitos conquistados nos últimos anos.

Além da manifestação que reuniu mais de 70 mil pessoas no largo da Batata, a sexta-feira foi marcada por greve e manifestações em diferentes pontos da cidade e da Grande São Paulo.

Estações do Metrô e da CPTM amanheceram em operação parcial, enquanto a circulação de linhas de ônibus foi interrompida. Outras categorias, como professores, trabalhadores da saúde, bancários e comerciários, também aderiram à paralisação.

ZONA LESTE

Na zona leste de São Paulo, logo pela manhã um protesto fechou a Radial Leste. Com a presença de cerca de 100 pessoas na região de Itaquera, o ato terminou com seis manifestantes detidos.

Cinco militantes do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e um professor dirigente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) foram levados ao 65º DP.

Durante o dia, estiveram presentes na delegacia os deputados federais Paulo Teixeira (PT-SP) e Major Olímpio (SD-SP). O padre Paulo Bezerra, pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Itaquera, também marcou presença em apoio a liberação dos manifestantes. No entanto, o delegado deve esperar até terça-feira (2) para tratar do caso.

Em São Miguel Paulista, uma concentração saiu da praça do Forró e seguiu pela avenida São Miguel. No mesmo distrito, no entanto, um grupo de jovens da Vila Jacuí, não aderiu aos protestos e aproveitou o dia para capinar um espaço público abaixo do viaduto que dá acesso às suas moradias.

ZONA NORTE

Contra as reformas, a privatização do parque Jaraguá e o fechamento da UBS local, indígenas pediram a demarcação de terras e bloquearam a estrada Turística do Jaraguá, na zona norte de São Paulo. “Hoje eles estão dizendo que a Previdência Social vai ter que aposentar os idosos com quase 70, 80 anos. Não vai dar nem tempo da pessoa receber o seu  dinheiro da aposentadoria” disse a Índia Arapoty, da Aldeia do Jaraguá, em um vídeo gravado pelo coletivo “Nós, mulheres da periferia”.

Com cartazes dizendo “nenhum direito a menos” e “vai ter luta na periferia”, um grupo de moradores de Perus caminhou pela avenida Doutor Silvio de Campos -uma das principais vias do bairro. Durante o protesto, também era possível encontrar faixas com as declarações “queixadas vivem”, fazendo alusão ao antigo movimento de luta dos trabalhadores da Fábrica de Cimento Perus.

ZONA SUL

Os protestos na zona sul começaram cedo em vários bairros. Os terminais Jardim Ângela, Capelinha, Grajaú, Guarapiranga, João Dias, Santo Amaro e Varginha permaneceram por toda manhã sem a circulação de ônibus ou a maior parte do dia com a frota reduzida.

Por volta das 6h da manhã, moradores das ocupações Nova Palestina (Jardim Ângela), Aristocrata e Anchieta (ambas no Grajaú), movimentos sociais, moradores, professores, estudantes e artistas, foram para as ruas e se encontraram no largo do Socorro. Manifestantes também bloquearam a Estrada de Itapecerica, nas proximidades da Estação Capão Redondo do Metrô.

Uma das participantes da manifestação na M’ Boi Mirim, Marilu Santos Cardoso, 40, moradora do Jardim Ângela e professora de história, diz que é testemunha da luta das pessoas que a antecederam e do esforço que tiveram para alcançar os direitos que tem.

“Sendo moradora, professora e educadora, me vi numa situação de que não sair hoje para as ruas, seria um ato de incoerência”, diz. “Foi um dos momentos mais bonitos do dia, ver a periferia se conectando, sem tumulto, com grito de ordem acompanhado por músicos que tocaram o tempo inteiro. Foi um encontro de energia em que a periferia luta em conjunto, com pessoas guerreiras que enfrentam os desafios da vida com alegria”, ressalta.

Por outro lado, também houve nos bairros reclamações por conta da falta de transporte, caso da enfermeira Simone Moraes, 40, moradora de Cidade Ademar.  “Não sou a favor desse tipo de protesto, mesmo sendo um direito. Acredito que somente com trabalho e honestidade obteremos uma cidade e consequentemente um país melhor”, afirmou.

“Hoje não consegui chegar ao meu trabalho para cuidar da saúde de pessoas que dependem de mim, devido a uma paralisação do transporte coletivo em prol de direitos que não sabemos se são coerentes ou não, sem prever as consequências que áreas como a minha teriam”, reclama.

GRANDE SÃO PAULO

As paralisações também tomaram várias cidades da Grande São Paulo. Barueri e Itapevi decretaram ponto facultativo tendo em vista a greve na linha Diamante da CPTM. Pela manhã, municípios como Mauá e São Bernardo estavam sem os trolebus. No centro de Carapicuíba, a estação de trem permaneceu fechada durante todo o dia, mas as empresas Del Rey e ETT Carapicuíba não aderiram à greve.

Também houve protesto pela manhã em Mairiporã. “Eu acredito que as reformas [trabalhista e da Previdência] afetam a todos, mas muito mais quem é da periferia”, disse o professor universitário Raphael Cruz, 33, que durante o dia participou de manifestações em Mairiporã.

“Esse impacto é mais profundo para quem não tem acesso às políticas públicas, com o aumento do índice de desemprego, mais famílias estão em vulnerabilidade”, ressalta.

Em Mogi das Cruzes, manifestantes caminharam pelo centro, na rua Doutor Deodato Wertheimer, e promoveram um ato em frente a prefeitura. “É uma perversidade. Uma das intenções é flexibilizar as regras de contratos temporários e sabemos que serão os jovens e as mulheres as mais afetadas”, afirma a assessora técnica Milena Leão, 29. “Sem pressão popular estamos rendidos”.

Texto: Aline Kátia Melo, Beatriz Sanz, Dalton Assis, Diogo Marcondes, Gustavo Soares, Humberto Müller, Jéssica Moreira, Jessica Silva, Karina Oliveira, Kátia Flora, Laiza Lopes, Lívia Lima, Lucas Landin, Lucas Veloso, Mônica Oliveira, Paulo Talarico , Priscila Gomes, Priscilla Pacheco, Rafael Balago, Tamiris Gomes e Vander Ramos. Edição final: Marina Lopes e Cintia Gomes

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