‘A moda não vive sem a periferia’, diz jovem estilista de Paraisópolis
Alex Santos era o único homem de uma turma de alunos, em sua maioria mulheres com mais idade que ele, em um curso de corte e costura oferecido por um projeto social em Paraisópolis, segunda maior favela de São Paulo, na zona sul da capital.
Essa realidade não era uma barreira para ele. Seu sonho já estava bem “costurado”. Enquanto as colegas de curso criaram uma lojinha para “consertos de roupas em geral”, Alex, 24, era mais ambicioso: queria ser reconhecido, virar um estilista.
Em 2013, decidiu ingressar no curso de Design de Moda, onde cursa o terceiro semestre na Universidade Anhanguera.
A decisão, no entanto, dividiu a opinião da família: de um lado, a mãe queria que o primogênito dos três filhos seguisse uma profissão mais “certa”; ao contrário do marido, que apoiou o filho desde o início. “Se é isso que você quer, vá atrás”, disse o pai, conta Alex.
Em abril deste ano, o estudante assistiu aos desfiles do projeto “Moda no CEU”, da Secretaria Municipal de Educação em parceria com o São Paulo Fashion Week, que buscou levar o mundo da moda à periferia. Descontente ao perceber que o cenário periférico não estava tão bem representado nas passarelas, o jovem resolveu criar o seu próprio projeto: o “Paraisópolis Inventando Moda”.
Em junho deste ano, com o apadrinhamento do estilista João Pimenta, Alex deu vida ao primeiro desfile de sua iniciativa, realizado no CEU Paraisópolis.
Suas criações buscam unir os conceitos de luxo e o lixo. “Moda e periferia: uma não vive sem a outra. O luxo seria a alta costura, um toque de requinte, enquanto o lixo, entre aspas, seríamos nós”, afirma. Ele apresenta amanhã (7), às 14h, no CEU Paraisópolis, o seu próximo desfile.
Sem qualquer apoio financeiro, o estudante também criou um workshop para dar aulas de passarela a meninas e meninos de Paraisópolis, que são os modelos das produções apresentadas em seus desfiles.
As apresentações contam com as peças criadas por ele e por colegas do curso de Moda, em parceria com outras iniciativas locais. “No desfile também terão peças produzidas por moradores que participam do projeto Recicla Jeans, que ensina a reutilizar o jeans para a criação de outras roupas”, conta.
LUZ NA PASSARELA
No dia 12 de outubro, o jovem estilista planeja um evento dedicado às crianças. “Será um desfile kids, com modelos mirins e com peças produzidas especialmente aos pequenos”, afirma ele, que pretende unir a moda e o grafite em produções futuras. “Meu sonho é fazer um desfile de moda baseado no grafite, junto com os grafiteiros”.
Enquanto isso não ocorre, paciente, Alex parece já colher os frutos do reconhecimento. “Muitos professores me param na rua para me parabenizar. Minha mãe está mais feliz, confiante no meu trabalho. E é só o começo”, comemora.
Para ele, enquanto o retorno financeiro não vem, agora é o momento de mostrar seu talento. “Quero ser uma inspiração para os jovens que acabam tendo de interromper seus sonhos no corte e costura, quando, na verdade, podem ser grandes estilistas, como eu quero ser”, conclui.
Vagner de Alencar, 27, é correspondente de Paraisópolis
@vagnerdealencar
vagnerdealencar.mural@gmail.com
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