Ex-empregada doméstica comanda time de futebol infantil no Viaduto do Glicério

Agência Mural

O sábado começou cedo para Tia Eva, como é conhecida Eva Mariza Alves, 61, moradora do Baixo Glicério, região central de São Paulo. A Comunidade Esportiva Novo Glicério, time de futebol de várzea comandado por ela, precisa estar pronta para receber mais um campeonato em seu campo, localizado embaixo do viaduto que leva o nome do bairro.

Para que tudo fique organizado, a moradora mantém uma rotina dinâmica. Ela tira fotos, distribui camisetas e prepara lanches: pão com mortadela e suco para todos. “Ninguém pode ficar sem. Assim que o jogo acaba, eles já ficam esperando”, afirma.

Desde 1980, quando se mudou para o bairro, Eva está envolvida com futebol.  Ainda se confunde com algumas regras do esporte, como a posição dos jogadores em campo, mas quando o jogo rola, a moradora corre de um lado para o outro.

Eva Alves mora em São Paulo desde os 12 anos (Foto: Arquivo Pessoal)
Eva Alves mora em São Paulo desde os 12 anos (Foto: Arquivo Pessoal)

Tia Eva saiu de Catanduva, interior de São Paulo, aos 12 anos para trabalhar como empregada doméstica na cidade que comemora hoje (25) 462 anos. Depois de brigas com os patrões, deixou o trabalho. Como não havia onde morar, passou a viver nas ruas.

Mais tarde, no início dos anos 1980, voltou a trabalhar como doméstica e conseguiu um pequeno apartamento, de aluguel, no Glicério. Lá, notou uma situação que a incomodou: crianças e jovens nas ruas, sem perspectivas, com sonhos adormecidos.

Aos poucos, Eva se aproximou das crianças e jovens até descobrir o que queriam: um time de futebol. “A tia não sabe como funciona [o futebol], mas se um ajudar o outro, a gente vai. Foi assim… nos demos as mãos e fomos”, conta. Mas os estudos sempre foram uma preocupação. “Quero que vocês estudem. Jogador de futebol também estuda”, diz sempre às crianças.

Jogo no campo da Comunidade Esportiva Novo Glicério (Foto: Carina Barros/Agência Mural)
Jogo no campo da Comunidade Esportiva Novo Glicério (Foto: Carina Barros/Agência Mural)

Com parte de seu salário, alugou um campo na Aclimação, região central, para fazer treinos uma vez por semana. No início, para ser aceito em alguns torneios e campeonatos, o time Comunidade Esportiva Novo Glicério teve seu nome alterado para Liberdade, bairro próximo com outro perfil social. A Taça São Paulo foi o primeiro campeonato da equipe, que hoje coleciona inúmeros troféus.

Hoje os garotos treinam apenas na sede da equipe que permanece embaixo do Viaduto do Glicério.

A cessão do terreno onde o Novo Glicério está instalado durou quase dez anos. Com a repercussão de uma reportagem sobre o projeto, em 2003, Tia Eva passou a ser responsável pelo espaço, que é público. O local, contudo, precisa de reformas. O alambrado que cerca o campo está amparado por pneus. “Outro dia, metade caiu, quase pegou os meninos. Tive ajuda dos bombeiros”, ressalta Eva.

Não há lixeiras e as poucas que estão instaladas encontram-se quebradas. O terreno onde o campo está localizado necessita ser carpido.

De acordo com Eva, há três anos, o convênio com a SEME (Secretaria Municipal de Esportes, Lazer e Recreação) foi interrompido. Após uma reclamação sobre o fim da parceria,  o projeto passou a ser mantido por uma emenda parlamentar aprovada na Câmara Municipal de São Paulo.

Desde então, Tia Eva conseguiu fazer com que mais de 200 jovens fossem atendidos. Para entrar no time, ela apenas pede uma declaração escolar e um pacote de papel higiênico de oito rolos para a matrícula.

“A Tia Eva mantém ações por meio do esporte para crianças e jovens, fortalecendo o bairro. É uma inspiração e referência de liderança”, afirma Diego Moreira, 30, educador na região.

Carina Barros, 31, é correspondente da Baixada do Glicério
@carinabarros

Comentários

  1. o mundo e o Brasil precisam é de pessoas iguais a Tia Eva.
    Tenho certeza que Deus reserva um bom lugar para ela junto dele.
    exemplos dessa grandeza é que devemos seguir.
    parabens d. eva, muitas crianças precisam da sra.

  2. Tia Eva está de parabéns por fazer a diferença. Mas é triste saber que muito que têm os recurso para ajudar nossas crianças, como tia Eva fazem tão pouco ou nada.

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